Cavaleiro das Trevas III: A Raça Superior ou Frank Miller transformado em commodity - 1º ensaio

Cavaleiro das Trevas III: A Raça Superior ou Frank Miller transformado em commodity - 1º ensaio

Muito já foi dito sobre Cavaleiro das Trevas III: A Raça Superior, nova investida de Frank Miller ao universo que o consagrou por definitivo em 1986, quando do lançamento da antológica minissérie original. Considerando-se que a HQ permanece incompleta, isso só reforça um fato: Miller segue como o maior e mais influente quadrinista da indústria norte-americana desde Jack Kirby. E isso não é Ki-Suco de groselha. Com a chegada da primeira edição às bancas brasileiras, via Panini, passa a existir a possibilidade concreta de um encontro efetivo com essa nova obra – a menos para aqueles com R$ 9,90 no bolso. Assim, o que proponho aqui é uma série de ensaios, um a cada edição, sempre escritos no calor da batalha. Apesar da perda do status de unanimidade, o volume de polêmicas e discussões geradas por cada movimento de Miller mostra que o velhote (que cronologicamente nem é tão velhote assim, batendo na casa dos 59 anos) ainda tem tinta pra queimar.

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Brasília no Social Comics!

por João Rodrigues

Artista plástica formada pela faculdade Dulcina de Moraes com pós-graduação em Design Gráfico e Editorial pelo IESB, Verônica Saiki é uma artista multitarefa que gosta de explorar as várias linguagens da suas áreas artísticas. “Eu adoro fazer ‘n’ projetos, como ilustrações de livros infantis, trabalhar com esculturas, etc”. Além desses trabalhos, que faz por conta própria e para clientes, Verônica também atua na área dos quadrinhos. Nascida e naturalizada em Brasília, ela é autora da série Verdugo - O Inacreditável. Criado em 2002, o personagem foi publicado em fanzines de 2007 a 2009, e em duas edições de 24 páginas pela editora Júpiter2 em 2014.  Agora, Verônica fez uma grande conquista: Sua nova obra, Verdugo - O Inacreditável: Procurados, não só está disponível fisicamente como também digitalmente na plataforma Social Comics, aplicativo considerado o “Netflix dos quadrinhos”. Assim como a plataforma de vídeos, os assinantes têm acesso a um número determinado de HQs para lerem quando quiserem.

Procurados também será lançado em papel. O lançamento acontecerá no dia 23 de abril, às 16h, na livraria Dom Quixote no Centro Cultural Banco do Brasil. Verônica recebeu a reportagem da Raio Laser enquanto começava os preparativos com antecedência. "Social Comics para mim foi uma porta gigantesca que surgiu. Logo que eu fiquei sabendo da disponibilidade da plataforma, fiquei curiosa para enviar o meu material e ver como é que seria a repercussão", exalta a autora. A artista estava para lançar a HQ e teve a ideia de oferecer a opção de que seus leitores pudessem ler o gibi digitalmente.  Desta forma, ela enviou o material do Verdugo para o aplicativo e, para sua surpresa, a resposta saiu rápido. "Como autora, posso dizer que já comecei com o pé direito", comemora. Verônica também falou um pouco sobre sua relação com os quadrinhos. Ela explica que foi influenciada a desenhar pelos gibis que lia na infância. "Muitas pessoas falam que aprenderam a ler com os quadrinhos. No meu caso, eles me ajudaram a desenhar".  Seus títulos favoritos eram Turma da Mônica, Tio Patinhas, Pato Donald, os gibis dos seriados Chaves e Chapolin (publicados no Brasil pela editora Globo entre 1991 e 1993), e também tirinhas de jornais. Níquel Náusea, de Fernando Gonsales é sua favorita, pois ela sempre gostou dos que puxavam para uma linha de humor ou que passassem uma mensagem bonita.

As inspirações da artista aparecem ao observar a atitude das pessoas nos lugares aonde vai, além da natureza e dos animais. Ela também sempre carrega consigo Zen em Quadrinhos (lançada pela Ediouro em 1996). "Eu acho muito interessante. Fala de comportamento humano e eu acho isso muito legal. Também me inspiro em livros voltados para temas naturais”.  Seu traço é voltado para o cartoon, sendo bem simplista e utilizando apenas o preto e o branco na maioria das páginas. Verônica também estudou por conta própria sumi-ê (também chamada de suiboku-ga, ou pintura à tinta, arte japonesa que tem sua origem e influência na caligrafia chinesa).  A artista possui uma loja virtual onde vende seus diversos trabalhos no mundo das artes plásticas. São quadrinhos e produtos baseados no Verdugo, caricaturas e/ou cartoons personalizados para noivos, etc. Questionada sobre futuros projetos para o mundo dos quadrinhos, Verônica demonstrou empolgação: “A plataforma Social Comics abriu um leque. Pretendo fazer outros quadrinhos, estou com umas ideias, uns projetos”.

Primeiros encontros entre Batman e Superman

Em fevereiro realizamos mais uma edição do nosso curso História dos Quadrinhos - Trajetória de uma Arte Sequencial e nos deparamos com uma turma muito interessada, conhecedora dos quadrinhos e disposta a ampliar e dialogar sobre este conhecimento. Dentre nossos melhores alunos estava o jornalista João Rodrigues, com experiência em jornais, blogs e podcasts, cujo objetivo atual é se especializar em cultura pop. Pedimos para ele escrever algo para a gente e ele trouxe este texto sobre a história dos encontros (e confrontos) entre Batman e Superman nos quadrinhos, aproveitando o gancho do novo filme de Zack Snyder. Como o filme saiu esta semana, achamos que era bom apresentar a vocês não apenas o texto, mas também este novo colaborador. Aproveitamos o espaço para, na caixa de comentários, debatermos também a respeito da qualidade do filme, que tem dividido opiniões. De um lado, a crítica "chauvinista" que achou seu roteiro irregular, cheio de furos e com precária caracterização dos personagens. De outro, os fãs dos personagens, que ficaram exultantes com o caráter sombrio, e boa direção de arte e os desdobramentos realistas do filme. E você, o que achou? Valeu João! (CIM)

por João Rodrigues

Batman vs Superman - A Origem da Justiça está chegando. O filme de Zack Snyder continua as histórias do Homem de Aço interpretado por Henry Cavill e trará o primeiro encontro dele com Ben Affleck no papel de Batman.  Pelos trailers e sinopses apresentados, já é fato que Bruce Wayne vai caçar Superman por causa da destruição causada na luta entre o herói e o general Zod. Para quem acompanha quadrinhos, o que foi divulgado até o momento não é nenhuma surpresa: os dois irão se enfrentar e logo virarão parceiros.  Porém, alguém sabe como se deu o primeiro encontro entre os dois nos quadrinhos? Bem, antes de fazer essa pergunta é preciso especificar de qual história (em que os dois estrelam pela primeira vez juntos) estamos falando. Sim. Heróis de gibis americanos têm sua origem recontada diversas vezes para não ficarem desatualizados com o passar do tempo.  Assim, personagens octogenários como Batman e Superman já se encontraram pela "primeira vez" muitas vezes.  Vamos conhecer alguns dos primeiros encontros entre os dois:

O primeiro dos primeiros:

O primeiro encontro: absurdo e na surdina

No período pós Segunda Guerra Mundial, os quadrinhos de super-heróis ficaram impopulares devido à onda de pessimismo devastadora deixada na sociedade norte-americana pelo conflito. Poucos heróis não foram cancelados. Superman e Batman foram dois deles (lembrando que a Marvel Comics ainda era chamada de Timely Comics e seus heróis populares - Homem-Aranha, X-men, Quarteto Fantástico - ainda não tinham sido criados).  Em Superman 76, publicado em 1952, Clark Kent e Bruce Wayne estão viajando de férias no mesmo cruzeiro. Como o navio estava lotado, os dois foram hospedados na mesma cabine. Do lado de fora, Lois Lane se mete em perigo para variar. Os dois heróis precisam se vestir para ajudar. Para não ser descoberto, Bruce diz que vai dormir e apaga a luz. Ele queria virar o Batman para ver o que estava acontecendo. Clark aceita, já que também pretendia aproveitar a escuridão pela mesma razão.

Porém, a luz de um farol ilumina o quarto deles e ambos vêem um ao outro assumindo suas identidades secretas. Sem nada podendo ser feito, os heróis se unem e resolvem a situação e prendem os responsáveis por uma tentativa de assalto. Depois, Clark e Bruce trabalham em conjunto para convencer Lois Lane de que eles não são Superman e Batman. A história possui toda a simplicidade e inocência costumeiras da Era de Ouro. Foi escrita por Edmond Hamilton e desenhada por Curt Swan. 

Na verdade, ambos já dividiam a mesma revista, World's Finest Comics, mas em histórias separadas. Após Superman 76, eles se encontrariam diversas vezes. Na Era de Prata, eram muito amigos.

O primeiro após Crise nas Infinitas Terras:

Em 1985, a DC Comics lançou a minissérie em 12 edições Crise nas Infinitas Terras. A saga foi criada para acabar com a cronologia confusa de décadas  e com a ideia das terras paralelas do Universo DC. Ao término dela, só uma terra existia e a origem de todos os heróis foi atualizada e recontada. A de Batman aconteceu no famoso arco de histórias Batman - Ano Um, escrita por Frank Miller, nas edições 404 a 407 de seu título mensal nos Estados Unidos. Já o Superman foi totalmente revitalizado pelas mãos de John Byrne na minissérie The Man of Steel, com desenhos de Dick Giordano. Com personalidades bem diferentes das da Era de Ouro, a nova versão do primeiro encontro dos dois, que aconteceu na terceira edição do arco, não foi amistosa como a anterior.  

Batman está em Gotham City caçando uma vilã quando sua corda é puxada por Superman, que queria prendê-lo por suas atividades ilegais de vigilante. Sabendo que esse encontro podia acontecer um dia, o Homem-Morcego diz que se o kryptoniano tocar nele, uma explosão acontecerá em algum ponto de Gotham matando um inocente.

Sem escolhas, o alter-ego de Clark Kent ajuda o morcego em sua caçada. Após a vilã ser presa, Superman descobre que Batman mentiu parcialmente e que a única vida em risco era a dele mesmo. Assim, mesmo contrariado, o Homem de Aço adquire um pouco de respeito e o deixa em paz. Bruce o vê partindo e lamenta que não possa chamá-lo de amigo. 

A história enfatiza a diferença entre um e outro. Um representava a luz e a esperança. Outro, a frieza e o pessimismo adquirido pelo assassinato dos pais. Obviamente, mais tarde ambos viraram amigos e atuaram juntos diversas vezes e também na Liga da Justiça.

A trama se passa no período conhecido como Era de Bronze dos quadrinhos norte-americanos. Nessa época, o comics code authority (Código de Ética dos quadrinhos americanos) estava em declínio. A inocência criada na Era de Prata deu lugar a tramas com elementos mais pesados como drogas, guerras e questões sociais que eram debatidas na época. Mesmo os que não traziam esses temas acabavam mostrando personagens com mais toques de realismo em seus comportamentos. 

Assim, Byrne e Miller deram comportamentos totalmente diferentes e bem definidos aos dois heróis no período Pós-Crise. Eles se respeitavam mutuamente, mas um desaprovava os métodos do outro. Suas aventuras conjuntas retornaram com Superman/Batman, publicada entre 2003 e 2011. Jeph Loeb escreveu os 25 primeiros números, mas saiu depois. A série terminou na edição 87. O primeiro arco da revista - Inimigos Públicos - virou animação em 2009.

Novos 52 e novo primeiro encontro:

Quase trinta anos depois de Crise nas Infinitas Terras, a DC novamente resolveu reiniciar sua cronologia e começar do zero. Assim sendo, os heróis tiveram suas origens novamente contadas. Esse é o mundo dos Novos 52. 

Esse primeiro encontro dos dois heróis não ocorreu somente entre eles, mas com todos os membros que formariam a Liga da Justiça. Na trama escrita por Geoff Johns e desenhada por Jim Lee, Batman conhece o Lanterna Verde e ambos estão sendo caçados por policiais que consideravam os vigilantes perigosos na época. No final da primeira edição, Superman aparece. 

Pensando que o Cavaleiro das Trevas e o Gladiador Esmeralda eram os responsáveis por um ataque que sofreu mais cedo, Superman avança contra ambos. Logo, o Flash aparece tentando acalmar a situação e evitar danos, mas acaba piorando as coisas. Sempre frio e calmo, Batman consegue ser ouvido por todos e explica que não teve nada a ver com o ataque. Como a polícia aparece novamente, os quatro fogem. 

Não irei me prolongar muito na história, pois ela não é o ponto deste texto. Os demais membros - Cyborg, Mulher-Maravilha e Aquaman, aparecem depois e todos detêm uma tentativa de invasão à terra liderada por Darkseid. Após o confronto, a Liga da Justiça é formada. O arco foi publicado entre a primeira e a sexta edições da segunda série da revista Liga da Justiça pela Panini Comics, e também no encadernado, lançado recentemente, Liga da Justiça - Origem. Uma versão animada da história (Justice League - War) também foi lançada. Até o momento, essa é a atual origem da parceria entre os dois.  Não há um consenso sobre o nome da era que estamos vivendo e nem uma caracterização dela. Hoje, temos diversos tipos de histórias dentro do mesmo universo. Boas, ruins, infantis, juvenis, adultas...

No caso d'Os Novos 52, a DC está sendo criticada por tirarem elementos importantes da personalização dos heróis. O Superman não fez sucesso. A nova versão não traz sua personalidade e imponência combinados à  humildade, como estamos acostumados. É um herói que não tem como inspirar os demais. Alguns super-heróis de quadrinhos estão sofrendo com o sucesso do cinema. Claro que é bom que os filmes estejam aí! Mas não podemos misturar as coisas. As HQs precisam manter suas identidades e não misturarem as coisas. Senão, os heróis podem não alçar os voos gloriosos de outrora.

Elas nos quadrinhos: 11 mulheres notáveis

O envolvimento de mulheres no universo das histórias em quadrinhos cresceu consideravelmente nos últimos anos. Com isso, aumentou também o interesse delas por maior representatividade nesse meio, seja no conteúdo apresentado nas HQs ou na identificação com mais artistas do sexo feminino. De Marjorie Henderson Buell, a Marge, criadora da personagem Luluzinha, até Marjane Satrapi, roteirista e ilustradora de Persépolis, não é difícil elencar talentosas mulheres envolvidas com quadrinhos.

Quem curte Marvel e DC Comics deve estar familiarizado com os nomes das roteiristas Barbara Kesel, Gail Simone, Jo Duffy e Louise Simonson; das desenhistas Jan Duursema, Amanda Conner, Colleen Doran e Jill Thompson, da arte-finalista Rachel Dodson ou da colorista Laura Allred. Editora, Karen Berger está diretamente ligada à criação do selo Vertigo, da DC, e foi responsável por títulos como Sandman e o Monstro do Pântano de Alan Moore.

Os colecionadores de cards de super-heróis, uma mania nos anos 1990, devem se lembrar de Julie Bell, pintora que ilustrou dezenas desses cartões, sempre em ambientes fantásticos e um tanto kitsch (selvas ou espaço), com personagens musculosos (ela foi fisiculturista!) bem ao estilo da revista Heavy Metal. E por falar na publicação, como não mencionar Olivia De Berardinis e suas maravilhosas pinups? Ou a arte erótica de Giovanna Casotto? O leitor brasileiro de mangá talvez não saiba, mas muitos dos quadrinhos japoneses publicados por aqui foram criados por mulheres, caso de Peach Girl, de Miwa Ueda, Fullmetal Alchemist, de Hiromu Arakawa, e o popularíssimo Ranma ½, de Rumiko Takahashi. Mulheres deixaram suas marcas nos gibis da Turma da Mônica, desde a pioneira Emy Acosta, até hoje na empresa e uma das responsáveis pela chamada “fase fofinha” do final dos anos 1970, até, em tempos mais recentes, a roteirista Petra Leão, escrevendo para a Turma da Mônica Jovem, e a desenhista Lu Cafagi, nas graphics Laços e Lições. A finlandesa Tove Jansson é criadora da séria Mumin, capaz de encantar crianças e adultos. A obra saiu no Brasil primeiramente pela Conrad e depois pela A Bolha, ousada editora tocada por Rachel Gontijo.  E se você leu Fun home ou Você é minha mãe?, ambos de Alison Bechdel, sabe que essas graphic novels estão entre as melhores da atualidade.

Essas mulheres são apenas algumas entre muitas produzindo histórias em quadrinhos no Brasil e no mundo. Entre as brasileiras, poderiam ser citadas tantas outras que atualmente publicam suas HQs de maneira independente ou trabalham para as grandes editoras de comics. 

Aproveitando o Dia Internacional da Mulher, a Raio Laser fez uma lista com onze mulheres cujos trabalhos merecem a sua atenção. São profissionais que se destacam pela criatividade, inovação e personalidade. Curiosamente, não vemos com frequência os nomes delas em outras listas de grandes mulheres dos quadrinhos. Fica aqui a nossa reverência e respeito. (PB)

por Lima Neto, Pedro Brandt e Ciro I. Marcondes

Marie Severin - Muitos são os nomes laureados pela história quando falamos sobre histórias em quadrinhos norte-americanas, mas um dos nomes femininos que vem certamente à cabeça é o da colorista, desenhista, letrista e designer Marie Severin. Nascida em 1929, Marie entrou para os quadrinhos colorindo a edição A Moon, A Girl... Romance # 9, de Outubro de 1949, com a arte de seu irmão, John Severin. A partir daí, Marie se tornou a primeira dama da EC Comics, colorindo a maioria de suas revistas, um trabalho marcado pelo contraste entre sensibilidade e impacto que deixou sua marca nos quadrinhos de guerra escritos e desenhados por Harvey Kurtzman. Quando a editora deu início à sua famosa e controversa linha de quadrinhos de terror, Severin - católica praticante - tinha o cuidado de dar um tratamento cromático às cenas mais visualmente ofensivas com azuis fechados que tornava mais difícil, para os pais, perceber o teor dos quadrinhos que compravam para os filhos. Convidado pelo próprio editor chefe, Stan Lee, Marie Severin brilhou na era de prata da Marvel Comics, sendo a principal colorista da editora. A partir dos anos 70, Severin começou a revezar o trabalho de colorista com o de desenhista, colocando seu traço a favor de personagens como Doutor Estranho (substituindo Bill Everett, que havia entrado no lugar de Steve Ditko), HulkHomem de FerroConan e Kull, o Conquistador. Marie foi ainda o nome forte da Star Comics, selo de quadrinhos licenciados da editora, onde trabalhou em títulos como Muppet Babies e Alf. Marie Severin era uma trabalhadora braçal dos quadrinhos de super-heróis e se aposentou com a chegada do século XXI realizando alguns trabalhos como a recolorização de clássicos da EC Comics para coletâneas especiais. Marie Severin carregou a indústria nas costas, foi a grande mulher da EC comics e deve estar presente em toda lista de grandes artistas da HQ norte-americana. (LN)

Wendy Pini- Formada, de certa forma, no caldeirão contracultural dos quadrinhos alternativos dos anos 60 em San Francisco, Wendy Fletcher (depois Pini) acabou se tornando vetor de várias transformações nos quadrinhos americanos a partir do fim dos anos 70, quando lança, junto com seu marido Richard, a lendária, soberba e cultuadíssima série Elf Quest de forma inteiramente independente, seguindo o modelo dos comix underground. Os Pini fundaram a própria editora (WaRP) para lançar toda a saga original desta série fundamental para se compreender a aproximação dos quadrinhos indie com o mainstream. Espirituosa (ela fazia cosplay da Red Sonja em convenções de quadrinhos), engajada e multitalentosa, Pini concebeu junto a Richard um universo fechado, complexo e repleto de inacreditáveis detalhamentos que já previa um final definitivo no início da saga (algo inédito na época). Além de conceber o imaginário de Elf Quest, ela trabalhava os roteiros junto ao marido e, é claro, ilustrou toda a série clássica com um apaixonante estilo límpido, todo afeito ao quadrinho mainstream, mas com profunda matriz autoral e domínio narrativo. Seus elfos são esguios, de beleza quase sobrenatural, e seu traço é vivaz como poucos quadrinhos de aventura conseguiram ser.

Em qualquer circunstância do ofício da ilustração para HQs, Pini é uma mestra absoluta: cenas de ação, expressões faciais, ricos cenários e criaturas, empaginação, etc. Além de, é claro, ter levado adiante o que, para mim, é um dos grandes projetos de longo fôlego na história dos quadrinhos: Elf Quest narra, em uma longa saga cheia de desdobramentos fascinantes, a trajetória de tribos de elfos invasores em um mundo neolítico similar à Terra, mas povoado por diversas criaturas fantásticas, poderes místicos e conflitos atávicos. Este quadrinho não apenas é uma entusiasmante obra de aventura, mas também de sofisticados conflitos familiares, romances tórridos e histórias lendárias de uma cultura pensada no seio da era hippie, na esteira de Shakespeare e Tolkien, com a diferença que, aqui, a personagem feminina tem papel preponderante. Seu protagonismo não é subjugado, sua influência no destino dos elfos não é marginal. Nada menos que revolucionário. (CIM)

Ann Nocenti - Imagine ser contratado para dar continuidade a uma série de peso como Demolidor. Imagine agora que você não apenas vai dar continuidade, mas vai começar a escrever logo após o clássico Queda de Murdock. Se essa responsabilidade já parece massacrante, imagine para uma editora cujos trabalhos até o momento se resumiam a duas minisséries no universo dos X-Men. A escritora Ann Nocenti entra nesta lista justamente porque soube lidar com esse desafio como ninguém e marcou seu nome nas revistas de herói da Marvel. Seus roteiros davam continuidade a uma tendência inaugurada com a série Lanterna Verde e Arqueiro Verde (de Danny O´Neil e Neil Adams): a de levar questionamentos sobre os problemas sociais de nossa época para as páginas dos gibis de SH. Sob a pena de Nocenti, entretanto, estes questionamentos sempre apresentavam uma área cinzenta onde as respostas estavam longe de serem fáceis e as intenções dos personagens sempre guardavam um viés secreto e pessoal. Feminismo, maltrato de animais, conflitos éticos e muito mais se tornam obstáculos a serem vencidos por seus heróis que, em sua maioria, eram telas brancas sem julgamento prévio destas discussões, colocando-os lado a lado com os leitores do período. Nocenti criou personagens memoráveis como Mary Tiphoid, Longshot, Black Heart (filho do vilão demoníaco Mefisto, que em sua fase vai apresentar um visual mais bestial que o tradicional criado por John Buscema), Mojo e Espiral. Nocenti trabalhou com a maioria dos personagens da Marvel e recentemente escreve para a concorrente em títulos como Mulher-Gato e a fase recente da Katana novos 52, série bem recebida pela crítica. (LN)

Sophie Campbell - Criada como uma cópia da Mulher Maravilha pelo famigerado Rob Liefeld, a personagem Glory foi relida brevemente pelo roteirista Alan Moore e, em 2011, por Joe Keatinge, que a reinventou mais uma vez. Esta versão mais recente da heroína foi ilustrada por Sophie Campbell, que imaginou a personagem como uma mulher grandalhona com rosto de bebê e cicatrizes de batalha pelo corpo. Por falar em rostos e corpos, Campbell é conhecida por ilustrar a figura feminina em diversas silhuetas e feições de diferentes etnias, dando à série uma diversidade de tipos rara nos quadrinhos americanos. Essa abordagem caiu como uma luva na série que ela assumiu em 2015, Jem and the Holograms (inspirada no desenho animado de mesmo nome, original de 1985 e exibido no Brasil pelo SBT entre 1988-1993). Em clima de série teen, a HQ, que tem roteiros de Kelly Thompson, mostra a rotina de uma banda de rock formada por quatro garotas em busca do sucesso, em meio a intrigas, romances mal resolvidos, inseguranças e descobertas. Sob uma paleta de cores berrantes, Sophie Campbell veste as garotas com penteados e figurinos extravagantes, tudo muito exagerado, o que dá toda a graça e impõe o tom divertido e leve da série. A desenhista também é autora de uma série própria, Wet Moon, na qual apresenta as desventuras emocionais de um grupo de universitários prestes a encarar o mundo adulto, ao mesmo tempo em que aborda com naturalidade questões de sexualidade e dramas existenciais. Ah, até 2015, Sophie era Ross, quando assumiu publicamente ser trangênero. (PB)

Angela e Luciana Giussani - Todas as estrelas desta lista brilham com luz própria. São artistas que trabalharam duro para ter seus nomes marcados na história das HQ's. Mas dentre todos estes nomes, apenas as irmãs Angela e Luciana Giussani detêm no currículo a proeza de terem criado um gênero dentro das HQ's: o fumetti neri, ou “gibi negro” em uma tradução livre. Ex -modelo, casada com um editor de revistas da época, Angela Giussani era um espírito livre e empreendedor. Em 1962 ela lança a revista Diabolik, um fumetti diferente onde se misturavam erotismo e vilania. O personagem homônimo é um ladrão de joias requintado e misterioso conhecido por sua habilidade de disfarce e seu código de honra. Um anti-herói em meio a uma sociedade mais corrompida do que ele. O fumetti tinha ainda como personagens a loira e moralmente ambígua Eva Kant, companheira de Diabolik, e o inspetor Ginko, sagaz e habilidoso. O policial só não é páreo para o ladrão por ser claramente limitado por sua moral. Diabolik fez um sucesso tremendo, não apenas por seu conteúdo polêmico, mas também por ter um formato curto, de bolso e com roteiros impactantes. Na edição de número 13, a irmã de Angela, Luciana, passa a auxiliar nos roteiros e, a partir daí, elas vão se revezando e trocando com outros roteiristas nesta que é a revista mais duradoura da Itália, já ultrapassando a edição 800. A partir de seu sucesso (que chegou aos cinemas, rádio, romances, TV e foi até homenageado na revista dos X-Men na fase do escritor Grant Morrisson), toda a Itália se rendeu a uma nova linha de narrativas sádico-eróticas com personagens mascarados. Todos com uma bem posicionada letra K, como Kriminal, de Luciano Secchi assinando como Max Bunker, e arte do fabuloso Magnus (Robert Raviola); os dois autores ainda criaram o gibi Satanik, que teve posterior sucesso com a série de fotonovelas. O sucesso deste fumetti neri também criou paródias e versões, como o famoso Paperinik, o “Super Pato”, identidade heroica do Pato Donald. Tudo graças ao pioneirismo destas irmãs milanesas que mostraram ao mundo como o quadrinho pode ser palco dos desejos represados de toda uma nação, como era o caso da Itália católica do período. (LN)

Lilian Mitsunaga - Responda rápido: O que Batman – Cavaleiro das Trevas, Asterios Polyp, Gibis da Disney e a revista Animal têm em comum? Todos estão no portfólio da letrista e lenda do quadrinho brasileiro Lilian Mitsunaga. Não tem como falar de histórias em quadrinhos no Brasil e não lembrar desta profissional que ensinou mais de uma geração de fãs a ler. Esta paulista, natural de Mauá, começou a trabalhar com o letreiramento de quadrinhos em 1980 com uma historinha de quatro páginas do ursinho Puff (Pooh para os marqueteiros). De lá para cá, Lilian se tornou pedra fundamental na adaptação de quadrinhos de fora para o mercado brasileiro. Seu profissionalismo e perfeccionismo foram elementos essenciais para que o artista David Mazzuchelli liberasse a publicação de sua graphic novel, a já citada Asterios Polyp, no Brasil. O trabalho de Lilian era tão respeitado que, nos anos 80/90, a letrista teve que trabalhar com pseudônimos em diferentes editoras para não transgredir o contrato com sua casa editorial – a Editora Abril. Com a chegada dos editores de texto, Lilian se tornou pioneira no domínio desta nova tecnologia, desafiando as vozes que diziam que o trabalho de letrista iria acabar. Muito pelo contrário, ao ler qualquer gibi letreirado por esta mestra, pode-se ver como a tecnologia precisa de pessoas capazes no comando para tornar a leitura um momento de prazer. Além de Asterios, podemos encontrar as letras de Lilian em Jimmy Corrigan (um dos trabalhos mais desafiadores para a letrista), Retalhos, Habibi e Sailor Moon. (LN)

Lynn Varley - Batman: O Cavaleiro das Trevas, 300 de Esparta, Elektra Vive, Big Guy e Rusty, Ronin... não, não estamos falando aqui do laureado Frank Miller, mas sim de sua ex-esposa e parceira de trabalho Lynn Varley. Junto com o ex-companheiro, Varley revolucionou o quadrinho de super-herói e elevou o nível de qualidade das cores dos gibis americanos. Juntando a influência de veteranas como a já citada Marie Severin, somado a influências europeias e orientais de abordagem cromática, Varley fazia das cores um espetáculo expressivo, e mesmo em seu pior momento – a trágica continuação de Cavaleiro das Trevas – a colorista criou um manifesto contra a pretensa naturalidade digital das cores “photoshopadas” que infestavam o mercado de HQ's e fizeram o sucesso da editora Image. Mas enganam-se aqueles que acham que esses foram seus únicos trabalhos. Varley é um dos nomes que colaboraram com o sucesso de American Flagg, de Howard Chaykin, e coloriu o traço das histórias em preto e branco de Moebius publicadas nos Estados Unidos pelo selo Epic Comics, da Marvel. Extremamente reservada, Varley continua trabalhando em edições especias e relançamentos de seu trabalho. Mas sua paleta de cor adicionou uma vibração única em um período revolucionário dos quadrinhos, estampando seu nome para sempre na história deste meio. (LN)

Érica Awano - Descendente de japoneses, Érica Awano aprendeu a desenhar no estilo mangá com as revistas em quadrinhos vindas diretamente do Japão que circulavam entre seus familiares. Ou seja, bebeu da fonte. Isso ajuda a entender como, em 1996, quando publicou pela primeira vez, ela já dominava os recursos gráficos típicos de uma HQ nipônica numa época que elas ainda não tinham invadido as bandas brasileiras. Sua narrativa visual é econômica, mostrando apenas o necessário para a continuidade da ação, e seu estilo de ilustração é elegante e delicado, clean, expressivo sempre que necessário – como tem que ser no mangá –, mas sem os exageros típicos dos quadrinhos japoneses. Em Holy Avenger, série de grande sucesso que desenvolveu com Marcelo Cassaro, é exemplar a maneira como Awano dosa os elementos apresentados ao longo da trama em suas páginas. O roteiro de Cassaro se equilibra entre o humor e a aventura, com um pouco de drama, muita ação e, às vezes, alguma violência, aliados à ambiguidade dos personagens, caso do ladrão Sandro Galtran e da insinuante elfa Niele (praticamente nua em toda a HQ). Ainda que o público-alvo da série (que durou 42 edições e teve vários especiais) fosse o infanto-juvenil, o material era produzido sem soar condescendente ou afrontar a inteligência do jovem leitor – a expectativa de muitos deles era que a série soasse como um autêntico mangá e não uma simulação disso. Entre trabalhos para o mercado brasileiro e o internacional, a mangaká ilustrou uma adaptação de Alice no País das Maravilhas roteirizada por John Reppion e Leah Moore (filha de Alan Moore), e a HQ do game Warcraft. (PB)

Posy Simmonds - Cartunista, ilustradora de livros infantis e autora de histórias em quadrinhos, a britânica Rosemary Elizabeth “Posy” Simmonds é uma veterana conhecida por cartuns e tiras publicados em jornais ingleses. Suas criações são sagazes sátiras à sociedade contemporânea. Esses são os ingredientes da única de suas obras publicadas no Brasil, Gemma Bovery, lançada por aqui em 2006, pela Conrad. Reinvenção em quadrinhos do clássico Madame Bovary, romance de Gustave Flaubert que causou escândalo quando publicado em 1857 por apresentar como protagonista uma mulher adúltera. Na trama da HQ, Gemma é uma inglesa aborrecida que se muda com o marido para uma pequena e aconchegante cidade francesa. Lá, descobre uma sensualidade adormecida e acaba se envolvendo numa relação fora do casamento. À distância, o vizinho de Gemma, secretamente apaixonado por ela, observa tudo. Publicado em formato retangular e vertical, a obra mistura narrativa em prosa, rica em detalhes, e em quadrinhos. A autora constrói um ritmo de leitura intimista, que joga o leitor para dentro das páginas e o transforma no voyeur a acompanhar de perto a protagonista. A HQ foi transformada em filme, uma simpática comédia dramática lançada 2014. Depois de Gemma Bovery, Posy Simmonds publicou Tamara Drewe, que também virou filme (em 2010). (PB)

Cynthia Carvalho: no Brasil, Frank Miller é uma mulher, e tenho dito. Os quadrinhos do Leão Negro, concebidos pela roteirista Cynthia Carvalho, primeiro surgiram como suplemento de quadrinhos de O Globo em 1987 (com ilustrações de Ofeliano). Depois ganharam a Europa, foram interrompidos e, mais recentemente, em 2010, os arcos das histórias originais foram retomados com os desenhos sensuais de Danusko Campos. Fosse este um mundo justo, Cynthia já teria levado um HQMix de “grande mestre” (ou algo que o valha). Ou, sei lá, o próprio prêmio teria o nome dela. Nada na história dos quadrinhos brasileiros se parece com Leão Negro. Em princípio, a aparência banal de quadrinho de aventura medieval engana o leitor que não se aventurar a ler as histórias. Porém, a leitura certamente os transforma. Leão Negro é o único quadrinho brasileiro aparentado com era de bronze dos quadrinhos americanos. É como se o cinismo realista do Demolidor de Miller, o ambiente robusto do Conan de Roy Thomas e a pegada pesada do Arqueiro Verde de Dennis O’Neil se encontrassem em algo que, ainda assim, ultrapassa o alcance destas referências.

Cynthia estabelece sua saga em uma ilha de cultura e tecnologia medievais onde acompanhamos a trajetória de uma família decadente de leões antropomórficos. Este mundo brutal, capaz de deixar até um fã de Game of Thrones com os pelos eriçados, não oferece qualquer signo de misericórdia. Crianças são exterminadas, fêmeas violentadas, famílias despedaçadas em conflitos fratricidas. Como eu disse em meu texto original sobre esta HQ: como gostar destes protagonistas felinos que são nada menos que polígamos, incestuosos, escravistas, lascivos e infanticidas? Cynthia, porém, dota estes personagens com profunda inflexão para a ambiguidade. Nada aqui é panfletário, ingênuo ou binário. Todos os seus anti-heróis são (ao contrário de uma babaquice pueril como o Justiceiro) enraizados em contextos verossímeis psicológicos, familiares e diria até socioculturais. Suas mulheres, mesmo atadas a uma sociedade de total submissão, são incrivelmente astutas, de intensa sagacidade e inteligência, e põe à prova dilemas contemporâneos através de um imaginário medieval fascista. Além de roteirizar estes injustiçados quadrinhos, Cynthia lançou em 2012 um ótimo livro de contos com histórias no mesmo universo. Logicamente, faz parte das melhores coisas já lançadas no gênero por aqui. Orgulho absoluto para a “cultura pop” brasileira. (CIM)

Considerações sobre a mídia "História em Quadrinhos"

A já clássica definição de McCloud Nos últimos tempos tenho me dedicado a leituras especializadas e à participação em cursos teóricos sobre a mídia "Histórias em Quadrinhos" (Comic Books) e, a partir dessa bagagem cultural, quero efetuar algumas breves considerações sobre o tema.

As obras teóricas Narrativas Gráficas, do genial quadrinista Will Eisner, e Desvendando os Quadrinhos, do estudioso Scott McCloud, são fundamentais para uma definição segura do que seja essa forma de arte e de comunicação. Eisner trata as HQs como verdadeiras "artes sequenciais", ou seja, enquanto "imagens dispostas em sequência, de modo a transmitir ideias e comunicar uma história".

McCloud tece uma definição mais específica, tratando as HQs como "imagens pictóricas e outras justapostas em sequência deliberada, destinadas a transmitir informações ou produzir uma reposta no espectador/leitor". Em outras palavras, as HQs seriam como que "recipientes midiáticos" que podem conter diversas idéias, imagens, temas, conteúdos, estilos e técnicas narrativas e artísticas, o que desde já desconstrói a opinião corrente de que possuem relação direta com temas específicos de caráter infanto-juvenil do porte de super-heróis ou de "animaizinhos" falantes engraçados. 

Apesar de muitas HQs possuírem tais conteúdos temáticos, elas não se resumem a isso e mesmo quando narram aventuras de super-heróis ou de animaizinhos falantes, tais como Watchmen, de Alan Moore, ou o Pato Donald, de Carl Barks, bem, tais HQs são impressionantes por vários motivos, sejam psicológicos, filosóficos, existenciais, históricos, sociológicos, dentre outros.

Na verdade, me parece que as opiniões depreciativas do público em geral sobre a mídia Histórias em Quadrinhos possuem diferentes motivos, a começar pela ignorância da maioria das pessoas sobre o que realmente seria tal veículo de comunicação e de manifestação artística (e emprego a palavra ignorância aqui em sua etimologia, como sendo o ato de opinar sobre algo sem o devido conhecimento de causa).

Juntando-se a isso temos a tradição de certos posicionamentos preconceituosos de educadores e "especialistas em juventude e adolescência" que, no decorrer das seis primeiras décadas do século XX, consideraram as HQs como sendo "vulgares, estúpidas, moralmente condenáveis e/ou como a expressão do baixo senso intelectual daqueles que não gostavam de livros". Muitos desses ditos intelectuais afirmavam em alto e bom tom que os leitores de HQs seriam jovens incapazes cognitivamente, sendo todos eles facilmente "manipuláveis diante de imagens de cores berrantes, rostos disformes e esgares contorcidos de ódio e terror, uma forma de manifestação que careceria de senso estilístico e gramatical".

Tais opiniões pejorativas e preconceituosas direcionadas às HQs aparecem no estudo de Thierry Groensteen sobre especialistas em juventude e delinquência nas décadas de 1950 e 1960. Muitas dessas opiniões sendo sintetizadas na impactante e absurda obra Seduction of the Innocent, do psiquiatra Fredric Wertham, de 1954. 

O autor desta obra, inserido no contexto do macarthismo (movimento político de perseguição a atividades consideradas subversivas que se baseava nos trabalhos de investigação do senado americano) estaria preocupado com a delinquência juvenil e com as influências nefastas de certos bens culturais midiáticos na moral tradicional estadunidense da época, o que levou a indústria das HQs à defensiva, condicionando a criação do tão difamado e contraditório Comics Code Autority.

Mesmo assim, a visão simplista sobre a mídia História em Quadrinhos não se resume a um contexto de paranoia coletiva ou mesmo de falta de senso “intelectual” sobre qualquer juventude transviada. É possível colocar na conta também de muitos especialistas das ditas humanidades que até a década de 1960 tinham posições bem demarcadas em torno da existência de uma cultura de elite em completa oposição a uma cultura popular, essa última sendo normalmente vinculada ao que se costumava denominar como "cultura de massas".

Escola de Frankfurt, Estudos Culturais

Para resumir essa dicotomia, é como se os artefatos culturais voltados para o homem comum, do povo, fossem naturalmente de baixa qualidade, quando não constituídos para a total alienação dos receptores de bens culturais, com fins ideológicos ou mesmo econômicos, dentro do processo de mercantilização e massificação da cultura do século XX. 

Alguns expoentes da famosa Escola de Frankfurt e também alguns pensadores marxistas expressaram posições que dicotomizaram a cultura como um todo, preocupando-se com os processos de alienação e dominação ideológica das massas via produção e difusão de bens culturais voltados para tais setores subalternos da sociedade (um viés importante, mas que acabou gerando tal visão hermética e unilateral das mídias em geral e dos quadrinhos em particular). 

Indiretamente ou não, as HQs, consumidas por milhares de jovens a partir da década de 1930, acabaram sendo depreciadas, sendo vistas como expressão da alienação das massas, como produtos massificados da ideologia dominante ou como bens culturais produzidos para fins exclusivos de lucro e acúmulo de riqueza de uma pujante e inovadora indústria cultural (é comum a utilização do termo mainstream, que designa certos artefatos culturais produzidos a partir de uma linha de produção de tipo industrial).

Ora, posso traçar aqui dois tipos de leituras teóricas distintas sobre os produtos massificados da dita indústria cultural mainstream, incluindo os quadrinhos, e isso, a partir das explanações do filósofo Douglas Kellner sobre o que ele tão bem denomina de “Cultura da Mídia”. 

Por um lado temos as leituras teórico-conceituais de alguns expoentes da Escola de Frankfurt (principalmente Theodor Adorno), que consideraram os produtos da indústria cultural (termo cunhado pelos pensadores dessa supracitada escola filosófico-teórica) como expressões da dominação de classe e/ou da alienação das massas. Por outro lado, temos os chamados Estudos Culturais Britânicos, que procuraram compreender a dialética intrínseca existente nesses produtos massificados, suas formas de alienação e ao mesmo tempo os posicionamentos críticos intrínsecos nos mesmos, ou seja, a expressão dos conflitos culturais e políticos existentes em nossa sociedade. 

Depreendo a partir disso que a visão preconceituosa da Escola de Frankfurt sobre os bens culturais da dita indústria cultural condicionou muitas das visões depreciativas no que tange aos quadrinhos, ainda que existam posições distintas que observam os produtos culturais voltados para as massas como sendo expressões igualmente críticas, subversivas e até inovadoras.

Canclini

Para ajudar no entendimento dessa dicotomia, seria possível traçar outras opiniões sobre bens culturais, agora a partir de dois importantes estudiosos da cultura: o primeiro, Edgar Morin, que relaciona a cultura de massas à indústria cultural para fins exclusivos de lucros rápidos em detrimento da cultura popular genuína e o segundo, Nestor Garcia Canclini, que considera existir uma hibridização entre a cultura de massas e a cultura popular, sendo a primeira consumida em razão de ecoar visões de mundo em amplos setores da sociedade contemporânea, porque mesclada ao popular, “ela se faz entender pelos receptores de bens culturais, podendo auxiliar, inclusive na formação crítica e da cidadania dos mesmos”, uma visão que se distancia da opinião corrente de que tudo o que é voltado para o povo significa alienação.

O caso da Marvel Comics

Para explicar como se daria a leitura de Canclini, seria imperativo trazer aqui um caso bastante peculiar relacionado à  famosa Marvel Comics, uma das grandes empresas de quadrinhos de super-heróis dos séculos XX e XXI. Exemplifico esse caso a partir das considerações extraídas da obra Marvel Comics, a História Secreta, de Sean Howe. Quando foi rearticulada em 1961 pelo escritor, roteirista e editor Stan Lee e pelo desenhista e criador Jacky Kirby, a Marvel se tornou uma espécie de "Casa das Idéias" de novos artistas, inovando o gênero dos super-heróis nos EUA e no mundo. Isso ocorreu porque os artistas da empresa colocaram em cena narrativas bastante antenadas com o contexto de seus leitores, gerando identidade nos mesmos em relação a super-heróis adolescentes ou mesmo homens e mulheres cheios de defeitos e contradições psicológicas, como se fossem meras pessoas comuns.

Quarteto Fantástico de Kirby: defeitos e contradições psicológicas

Com o tempo, porém, o espírito criativo foi entrando em conflito com o espírito corporativo da empresa, ocorrendo uma expansão gradual da linha de super-heróis Marvel e dos lucros das empresas que gerenciavam a linha editorial do gênero (só para constar, ao longo das três primeiras décadas de reformulação, a Marvel passou por três corporações diferentes). 

Starlin: comics não-alienados

Nos anos 1970 e 1980, certa independência dos artistas e editores-artistas geraram narrativas bastante engajadas, críticas e inovadoras (as narrativas cósmicas de Jim Starlin, por exemplo, fugiam a qualquer espírito corporativo que tivesse preocupações exclusivas com os lucros imediatos ou com qualquer alienação) ao mesmo tempo em que foram sendo controladas pelo corpo editorial, mais tarde centralizado nas mãos do virtuoso roteirista Jim Shooter.

No final dos anos 1980 e início dos anos 1990, as coisas mudaram radicalmente, visto que os próprios artistas, agora verdadeiras celebridades do meio, começaram a não se preocupar mais tanto com a qualidade das narrativas de super-heróis, mas sim com desenhos multicromáticos e detalhistas, além de ações impactantes que gerassem nos leitores o fascínio pelas HQs, incrementando assim a mercantilização por parte de colecionadores e/ou especuladores do gênero, em meio ao crescimento do público mais adulto e consolidação das lojas de revistas especializadas (o chamado mercado direto de vendas). 

Artistas como Todd McFarlane e Rob Liefeld não precisavam de ordens de cima para se desvencilhar daquele espírito crítico e dinâmico da Casa das Ideias dos anos 1960, 1970 e início dos 1980. Eles simplesmente foram se inserindo no esquema dos especuladores de HQs cromáticas, com capas e artes detalhadas ao extremo e histórias cheias de ação gratuita e vazias, quase que pasteurizadas. Ainda assim, bons arcos podiam aparecer na Marvel e nada era maquiavelicamente pensado para alienar ou mesmo para gerar convulsões sociais entre os jovens leitores.

Os lucros sempre fizeram parte da equação empresarial, desde os anos 1960 (até antes disso, nos tempos da Timely Comics) e não afetaram diretamente as boas idéias dos artistas da empresa nas primeiras décadas de reformulação Marvel, ainda que por causa dos descontentamentos por direitos autorais, muitos desses artistas tenham se desentendido com a Marvel ao longo dos anos (incluindo o maior dos criadores do universo Marvel, Jack Kirby).

Spawn, de McFarlane: em tudo, excessos

Estudos sobre quadrinhos no Brasil

Agora, seria importante mencionar também que existem no Brasil diversos especialistas em HQs, todos eles referências para qualquer estudioso que pretenda seguir por essa seara, muitos dos quais respeitados em suas respectivas áreas de conhecimento, o que demonstra uma mudança gradual acerca do olhar voltado para essa mídia. 

Alvarão de Moya, na Primeira Exposição

Internacional de Histórias em Quadrinhos

Nomes como de Álvaro de Moya, Antônio Luiz Cagnin, Zilda Augusto Anselmo, Waldomiro Vergueiro, Sérgio Augusto e Moacy Cirne devem ser listados nas bibliografias de qualquer trabalho acadêmico sobre a mídia, sendo que todos esses autores possuem trabalhos complexos e interessantes que são facilmente encontrados na internet. 

Em um artigo recente, Vergueiro específica os tipos de estudos acadêmicos existentes sobre quadrinhos na USP e sua classificação pode auxiliar quaisquer novos pesquisadores sobre o assunto. Em primeiro lugar existem aqueles estudos que tratam da linguagem das HQs, a forma como são constituídos, com seu tempo espacializado, sua elipse narrativa, as formas de enquadramento e de perspectivas, as representações de sons, chamadas de onomatopeias, as linhas cinéticas que dão movimento às imagens e até mesmo o estudo da "sarjeta", que seria aquele espaço vazio entre os quadros e que serve à elipse narrativa, onde os leitores interagem com o escritor para dar continuidade e significados às sequências dispostas.

Em segundo lugar podemos elencar a análise de conteúdos, ou seja, os significados presentes nas HQs, bem como os processos de codificação das mensagens das mesmas. Em terceiro lugar, temos as análises históricas das HQs, quando foram produzidas, publicadas e distribuídas e as relações com os seus respectivos contextos históricos, o que seria a análise das conjunturas, do levantamento das publicações e da recuperação da memória das narrativas, seja dos artistas ou de seus editores. Em quarto lugar são elencadas as análises das sociedades e culturas subjacentes às produções de HQs, que seria uma abordagem relacionada a temas comuns presentes nas mesmas e em nossa sociedade e cultura, tais como violência urbana, guerra, racismo, sexismo, feminismo, xenofobia, etc. 

Seguindo aqui as premissas do historiador Paul Veyne, “todo estudo histórico é igualmente sociológico, significando que as perspectivas histórica e sociológica se interpenetram”. Outras formas de leituras seriam a análise técnica e estética das HQs, as formas de aplicações práticas em marketing, bem como as análises de recepção, ou seja, como as histórias foram lidas e quais as reações do público leitor ante as narrativas das mesmas (essa tarefa é facilitada hoje em dia devido à internet e blogs especializados, aonde os leitores efetuam comentários sobre o que foi publicado em termos de narrativas gráficas). Isso sem falar nos estudos sobre a economia das HQs, as tendências de mercado, os tipos de público para cada gênero, suas segmentações.

Coloco aqui mais um tipo de estudos que me interesso sobremaneira, os estudos sobre os "usos do passado", ou seja, estudos sobre o contexto histórico de produção e difusão de algum arco ou história que tenha um passado histórico qualquer como tema (por exemplo, a famosa obra Asterix, de René Goscinny e Albert Uderzo, que trata da conquista das Gálias por Júlio César no século I A.C.), o que sugere uma análise sobre a forma como é representado esse passado no mundo contemporâneo.

O caso de Alan Moore

Para finalizar, gostaria de tecer alguns comentários sobre Alan Moore, que criou narrativas de extrema qualidade do porte de Watchmen, V de Vingança, A Liga Extraordinária, Do Inferno, Promethea, e tantas outras.  Após observar atentamente seus comentários no documentário The Mindscape of Alan Moore percebo que sua obra Promethea é a expressão mais genuína daquilo que ele define como arte e magia. O que me impressiona em Moore, além de sua enorme erudição, é o fato de vincular arte com magia, como se uma manifestação artística fosse a elevação do homem para outro nível de consciência, como se o artista, inspirado por forças mágicas, pudesse, com seus artefatos culturais, moldar e transformar o nível de consciência dos indivíduos de modo que esses transformem a realidade à sua volta, adquirindo uma consciência igualmente mística ao tocar o mundo sobrenatural com tal consciência.

Promethea: ocultismo, kabhala, esoterismo - some crazy shit!

Para muitos críticos das opiniões de Moore (e devo dizer aqui, críticos que não entendem o conteúdo das palavras do roteirista inglês), isso parece a expressão da mais pura insanidade embebida em drogas, mas Moore reinterpreta, por meio de seus conhecimentos e releituras sobre Ocultismo, Kabhala e Esoterismo, o que pensavam os antigos poetas aedos gregos, que concebiam sua poesia como a inspiração das musas e das forças primordiais, como se fossem tocados pela luz da verdade. 

Como bem reitera o estudioso antiquista Marcel Detienne ao tratar do pensamento mítico entre os gregos antigos, a aletheia significaria para eles a verdade, a luz que ilumina o homem com a inspiração das musas, que tira os entraves da ignorância e da escuridão, representadas pela lethe. Para os aedos, ou seja, para os poetas gregos dos tempos homéricos, a arte servia para a inspiração e a elevação do pensamento humano, das consciências. 

Se Moore tem alguma leitura teórica sobre tudo isso, é difícil afirmar (eu realmente acredito que sim), mas com certeza seu conhecimento empírico, embebido pela literatura, pela filosofia e pela mitologia (a partir das premissas de Joseph Campbel, presumo) fez com que ele se veja como um poeta aedo dos quadrinhos, o que estaria próximo das artes da magia. 

O fato de ele se ver como um mago leva muitas pessoas a taxarem-no de insano ou excêntrico, mas a magia para ele seria a arte que inspira e toca a consciência do seu público leitor e isso, para os grandes filósofos gregos (como Aristóteles, por exemplo) seria o dever da poesia, de inspirar e colocar as grandes questões existenciais em pauta. Só para finalizar essas breves considerações: Moore chega a afirmar que mitologia é uma forma de linguagem complexa (e quanto mais deuses existentes em um corpus mitológico, mais complexa), uma ideia encontrada em pensadores como Roland Barthes e Juanito de Souza Brandão. 

Se ele leu os dois pensadores, realmente não sei afirmar, mas ele expressa ideias bastante ricas e complexas e isso mostra que sua obra não é apenas um punhado de tinta e letrinhas psicodélicas sobre o papel. Se pararmos para pensar em tudo isso, podemos afirmar então que os quadrinhos possuem um alto grau de abstração e sabedoria de vida, tal como seriam os mitos para Moore e Campbell, claro, desde que bem escritos, elaborados e articulados.

O que depreendo de todas essas considerações estabelecidas no presente texto é que, antes de julgarmos as Histórias em Quadrinhos como uma forma de arte ou de comunicação eminentemente popular de massas (em seu sentido depreciativo) e alienante, que conheçamos antes seus autores, produtores, desenhistas e leitores e que percebamos a complexidade dessa mídia, ou seja, que vejamos as suas especificidades e riquezas. 

A mídia, histórias em quadrinhos pode conter diversos tipos de narrativas, podendo ser narrativas infantis, adultas, adolescentes ou até mesmo mescladas, contraditórias e misturadas, com toques variados. Podem ser até mesmo ensinamentos filosóficos para a elevação da consciência humana. Vejamos os quadrinhos como devem ser vistos, ou seja, como uma forma de comunicação e de manifestação artística, logicamente que apropriada pela industrial cultural mainstream para a geração imediata de vultosos lucros, ainda que possuindo diversos elementos interessantes, críticos e até subversivos. 

Quadrinhos na folia: 10 uniformes nota 10!

Olá leitores da Raio!

É Carnaval! Muitos dos nossos leitores passam o feriado lendo as pilhas de gibis acumuladas nos últimos meses, mas outros tantos vão cair na farra de Momo e deixar o espírito carnavalesco tomar conta. Para esses, a Raio fez uma listinha de alguns personagens dos quadrinhos cujos uniformes parecem ter sido criados sob o efeito delirante da folia! (LN)

10 – Beyonder

Para começar apoteoticamente, temos o ser mais poderoso do universo Marvel, a personificação da criação e deus confuso conhecido por Beyonder!

Durante a minissérie Guerras Secretas II, este ser todo poderoso com rosto de David Hasselhoff passa a adotar este garboso e brilhante uniforme. Uma criação dos geniais John Buscema e Tom Palmer. Todo o luxo de uma fantasia confeccionada com o mais reluzente metal alienígena. Uma fantasia tão à frente de seu tempo que já adiantava a tendência noventista de bolsos sem utilidade e ombreiras totalmente cenográficas. Neste belo exemplar de exagero estilístico de deixar nosso querido Clovis Bornay orgulhoso, a nova roupa do Beyonder chega zunindo com suas turbinas em décimo lugar.

9 – Penumbra (Shadow Lass)

Em nono lugar temos a presença de um design vindo direto do futuro. Criada por Jim Shooter e Curt Swan, Tasmia Mallor – a Penumbra da Legião dos Super-heróis, é o sonho de qualquer bateria de escola de samba. Um corpo escultural, uma pele de raro azul e um uniforme que mistura o negro e o dourado em peças mínimas prontas para fazer as arquibancadas se levantarem em aplauso! Sua fantasia, uma roupa cerimonial de campeã hereditária do planeta Talok VIII, foi pensada de forma a valorizar sua tonalidade azulada seguindo a tradição de heroínas como Lady Fantasma (menos é mais). Não é muito difícil de imaginar uma Luiza Brunet em seus melhores anos desfilando em uma fantasia como esta, o corpo pitado de azul e muito samba no pé.

8 – King Mob

Saindo do luxo dos bailes e sambódromos, nossa próxima fantasia é perfeita para um bloco de rua. Trata-se da roupa de combate do assassino anarquista King Mob, líder dos Invisíveis. O uniforme, uma mistura entre a obsessão de Grant Morrisson  com máscara de mergulho  e o fetiche de couro das raves europeias, é o exemplo de uma fantasia  criada a partir de elementos do dia a dia,  construindo um visual que é muito pomposo para ser levado a sério. Diversão garantida, com direito a marquinha de baton no melhor estilo dos grupos de pagode descartáveis que divertem de tão ruins. Jogue uma bermuda de vinil no lugar da calça e troque a jaqueta por um coletinho de couro e temos uma fantasia com garantia de agradar e assustar os foliões como um excêntrico BateBola sexy.

7 – Rei Relógio

Em sétimo lugar temos William Tockman, o Rei Relógio. Assim como King Mob, a fantasia do Rei Relógio é perfeita para quem quer  se esconder na folia. Seu visual, entretanto, é um deleite para qualquer carnavalesco, um modelito bizarro e ridículo que alegraria qualquer ala carnavalesca que aposte na temática das horas e dos relógios. Tockman era um vilão sem poderes e obcecado pelo tempo e pelos relógios, e uma ala com esta temática garantiria uma ótima pontuação no quesito "pontualidade" para qualquer escola de samba.

6 –  Vartox

Também sabemos que é recomendado o uso de poucas roupas no verão escaldante do nosso Brasil e sabemos também que a exposição de corpos nus no Carnaval não deve ser exclusividade das mulheres. Se você concorda com essas afirmações, então o uniforme do herói  Vartox é perfeito para você. Outra criação de roupas mínimas do mestre Kurt Swan, a fantasia e o personagem de Vartox é uma influência direta da roupa (também carnavalesca) de Sean Connery no filme psicossexual Zardox. Aqui temos uma refrescante fantasia para ser levada para as ruas, exalando muita sensualidade e virilidade. Sucesso garantido entre foliões de ambos os sexos!

5 – Capitão Bumerangue

Mais um uniforme para abrilhantar qualquer ala temática de escola de samba. Misture um quepe aeronáutico, uma camisa azul bufante estampada com inúmeros bumerangues, uma calvície que insiste em manter longas madeixas e um longo cachecol de seda branca e temos o australiano Digger Harkness, o Capitão Bumerangue. Uma fantasia unissex, com uma caracterização definitivamente carnavalesca, a roupa criada por Carmine Infantino dá uma graça aérea, e divertidamente risível, a qualquer desfile.

4 – Batman de Zur-Em-Arr

Você, caro carnavalesco, quer produzir uma fantasia de Batman para pular carnaval mas não tem nenhum tecido em mãos que se pareça com a roupa do homem-morcego? Ou você deseja homenagear seu boneco fabricado no Paraguai, aquele que vinha junto com o Home-Aranha e o Max Steel? Seus problemas acabaram. Com a fantasia de Batman de Zur-Em- Arr, o Batman alienígena de uniforme criado pelo saudoso Dick Sprang, você pode pular o carnaval vestido como seu herói preferido e misturando qualquer peça de roupa que encontrar pela frente. Diversão e economia para qualquer pulador de bloco.

3 –  Girl One (Top Ten)

Sexy e prático, o uniforme da policial da cidade de Neopolis – Girl One – é concorrente direto da nossa mulata globeleza. A personagem, policial do distrito Top Ten do gibi homônimo criado por Alan Moore, tem como poder não apenas força e resistência, como um controle refinado dos pigmentos da pele. De fato a personagem anda nua em todas as cenas, sua fantasia não passa de diferentes padrões de pigmento espalhados pelo corpo escultural  - nem Vanessa Valenssa consegue brilhar mais na passarela.

2 – Kraven

Nossa penúltima fantasia é possuidora de um luxo selvagem e um toque piegas que é imprescindível em qualquer fantasia de baile que se preze. Essa fantasia carrega na originalidade e ostenta pelo uso de uma cabeça de leão devidamente caçado e empalhado como peça principal e equlibra  a composição com uma despojada calça lycra adornada de textura de onça e uma sapatilha. Luxo, leveza e poder animalesco são a definição da roupa do único e inimitável Kraven, o caçador. Uma bela criação de Steve Ditko para o Homem-Aranha e uma certeza de encanto e respeito tanto no salão quanto no sambódromo.

1 – Homem-vergonha

Em nosso primeiro lugar temos uma fantasia especial para todos os foliões de rua. Absolutamente prático, mas sem esquecer-se de suas origens de herói da casa das idéias. o uniforme criado por Johnny Storm para disfarçar a identidade secreta do Homem-Aranha após Peter Parker ter o vínculo com o uniforme alienígena cortado desponta como a fantasia de carnaval  perfeita para aqueles que não tem fundos o suficiente mas que podem se sair bem com um macacão azul e um saco de pão. Tradicional e inovador, é uma fantasia nascida do lixo para nenhum Joãozinho 30 botar defeito.

BONS QUADRINHOS QUE LEMOS EM 2015 - PARTE 4

A gente tinha falado que a lista do Pedro era a última, mas aí o nosso novo (e brilhante) colaborador Márcio Jr. nos enviou, como chave de ouro, mais estas 20 indicações de quadrinhos lidos em 2015. Totalizamos então 52 indicações devidamente resenhadas para você ler em 2016. Mãos à obra! (CIM)

Parte 1

Parte 2

Parte 3

por Márcio Jr.

Amo quadrinhos. Comecei a guardá-los desde que comprei Superaventuras Marvel nº 1, da Abril, em 1982. Da lá pra cá, a coisa meio que saiu de controle. Compro mais do que sou capaz de ler (ainda que toda compra tenha o claro - e fantasioso - propósito de ser lida em algum ponto do futuro). Não acho que isso seja muito saudável. Já pensei em terapia. Fiz as contas e percebi que ficaria mais caro que comprar os gibis. Sigo acumulando papel.

Numa tentativa de estabelecer um filtro nas aquisições, comecei a anotar na agenda todas as leituras e compras feitas ao longo do ano. Não deu muito certo. Em 2015, li em torno de 150 HQs. Devo ter adquirido o quádruplo disso. Ao menos serviu para mapear as leituras do período, o que nos traz a esta lista de melhores. Os meus melhores quadrinhos de 2015. (O que não quer dizer que tenham sido obrigatoriamente publicados em 2015. Alguns dos títulos estavam ali, esperando leitura há um bom par de anos.)

Listas são sempre subjetivas, incompletas, blábláblá. Dane-se. Esta é a lista que me agarrou pelas vísceras. Tem uma certa hierarquia nela, mas nada para se levar muito a sério. Eu mesmo não levo. Olhando para a lista, gosto de acreditar que seja uma bela porta de entrada para qualquer pessoa minimamente inteligente  que nunca leu uma HQ. Maurício de Sousa não vale. Faça o teste. Se não gostar, desista dos quadrinhos. A campanha do Bolsonaro precisa de você.  

1- TALCO DE VIDRO - Marcello Quintanilha (Veneta, 2015)

Mal baixamos a guarda após o nocaute provocado em 2014 pelo já clássico Tungstênio, e Marcello Quintanilha nos faz beijar novamente a lona com Talco de vidro. Niteroiense radicado em Barcelona, Quintanilha tem construído uma obra originalíssima, sem paralelos, transbordante de uma brasilidade impossível de ser capturada em clichês. Não por acaso, tem amealhado tudo quanto é prêmio (de  quadrinhos e literatura) ao redor do mundo. Em Talco de vidro - um tratado acerca da ordem indizível da inveja -,  mais uma vez expande seus próprios limites, gráficos e narrativos. De quebra, leva a linguagem das HQs a novos horizontes. Em lugar algum existe alguém fazendo quadrinhos como Marcello Quintanilha. Imperdível.

2- OS OLHOS DO GATO - Alejandro Jodorowsky e Moebius (Nemo, 2015)

Publicada originalmente no Brasil em 1987 pela Martins Fontes (em edição hoje raríssima  e disputada no fio da navalha por colecionadores), esta obra-prima finalmente retorna às livrarias, após inexplicáveis 28 anos. Cortesia da Editora Nemo - que diga-se de passagem, tem feito um belíssimo trabalho suprindo a inexplicável semi-ausência de Moebius em terras brasileiras. Simbolismo polissêmico, quadros que ocupam a totalidade da página, experiências envolvendo campo e contra-campo, a tensão dialógica estabelecida por uma arte alternadamente minimalista e detalhada, tudo isso está presente neste álbum, um clássico nascido do acaso, como nos explica o mago Jodorowsky em seu prefácio.  

3- A CHEGADA - Shaun Tan (SM, 2011)

A chegada, do australiano Shaun Tan, é daquelas HQs que dão vontade de sair mostrando para todo mundo, como prova irrefutável do quão rica, sofisticada e artística pode ser a linguagem dos quadrinhos. Uma epopeia tocante sobre migração, banhada em realismo fantástico. Tudo isso sem uma palavra sequer. Espetacular é pouco.

4. KAPUTT - Eloar Guazzelli (WMF Martins Fontes, 2014)

O multi-artista Eloar Guazzelli tem se tornado o maior nome de um gênero muito em voga nos quadrinhos brasileiros: a adaptação literária. Os dois Jabutis que ele papou em 2015 (um deles com este Kaputt, adaptação da obra do italiano Curzio Malaparte) não me deixam mentir. Guazza é também o quadrinista mais rápido de que se tem notícia: 700 páginas em seis meses é uma marca de deixar de orelha em pé velocistas lendários como Jack Kirby e Julio Shimamoto. A explicação me foi dada pelo próprio autor: "Quadrinho paga mal, então eu tenho que produzir muito para que seja viável economicamente." O xis da questão é que Guazzelli consegue produzir muito e com qualidade inquestionável. Para isso, desenvolveu uma estética muito peculiar, que converte brilhantemente urgência em estilo. Em Kaputt, profundo tratado acerca dos horrores do nazismo, baila entre diferentes abordagens gráficas, que vão do nanquim anoitecendo toda a página ao lápis de cor que beira o sublime. Um livraço, cujo lugar na estante é ao lado de Maus, de Art Spiegelman.

5 - COLEÇÃO HISTÓRICA MARVEL QUARTETO FANTÁSTICO Vol. 1 - Stan Lee e Jack Kirby (Panini, 2015)

O patético filme do Quarteto Fantástico teve ao menos um efeito colateral positivo: o lançamento no Brasil dos quatro volumes da Coleção Histórica Marvel, dedicados ao grupo que é a pedra fundamental da editora. Na primeira edição, Stan Lee e Jack Kirby estabelecem todos os parâmetros dos quadrinhos de super-heróis e nos entregam o que de melhor o gênero pode oferecer: personagens carismáticos, ação ininterrupta, imaginação tresloucada e arte embasbacante. O Dr. Destino, tema deste primeiro volume, é o único capaz de disputar com o Coringa o posto de vilão mais cool dos comics. É um pecado mortal as 102 edições originais do Quarteto, sob a batuta de Lee e Kirby, permanecerem sem publicação digna e completa no Brasil. São insuperáveis.

6- CASTELO DE AREIA - Pierre Oscar Lévy e Frederik Peeters (Tordesilhas, 2011);

AÂMA Vol. 1 - Frederik Peeters (Nemo, 2014);

PÍLULAS AZUIS - Frederik Peeters (Nemo, 2015)

2015 foi o ano em que finalmente entrei de cabeça na obra do suíço Frederik Peeters. Meu maxilar ainda está deslocado. O primeiro contato se deu no magnífico Castelo de areia, poderosa alegoria sobre o envelhecimento, onde a serena narrativa gráfica de Peeters dá o tom exato ao roteiro do documentarista oscarizado Pierre Oscar Lévy. Pílulas azuis, tocante HQ autobiográfica em que o quadrinista narra sua vida ao lado de uma portadora do vírus HIV está em todas as listas de melhores do ano. Nada mais justo. E o menos badalado (mas não menos espetacular) Aâma pode ser descrito como uma ficção científica existencialista. Três excelentes trabalhos que apontam em direções diferentes, unidas pelo senso de humanidade presente na arte de Frederik Peeters. Craque.

7- SERES URBANOS - vários (Independente, 2015)

No início dos anos 90, era pré-internet, Weaver Lima, Lupin e mais um bando de moleques cearenses criaram o coletivo Seres Urbanos e entupiram as caixas de correio do Brasil com uma tonelada de fanzines ultra envenenados, talento e transgressão escorrendo do papel. Fizeram história. Parte dela está registrada nesse livro (bancado com uma lei de incentivo local), indispensável em tempos de gourmetização fanzinística. Weaver garante que um segundo volume está a caminho, só com conteúdo impublicável. Mal posso esperar.

8. DAYTRIPPER - Fábio Moon e Gabriel Bá (Panini, 2011);

DOIS IRMÃOS - Fábio Moon e Gabriel Bá (Quadrinhos na Cia., 2015)

Falar sobre Daytripper é chover no molhado. Solidificou o nome dos gêmeos Moon e Bá dentro e fora do Brasil, ganhou prêmios, vendeu pra caramba. Merecidíssimo. (Mesmo com aquele papo estranho sobre plágio.) Depois de tanto sucesso, deve pesar bastante a expectativa sobre um próximo trabalho.

Dois irmãos, adaptação do romance homônimo de Milton Hatoun, veio para ratificar todas as conquistas pregressas. Não conheço o livro original. Ponto para a adaptação, que funciona espetacularmente como HQ. Salta aos olhos a verossimilhança dos personagens e seu entorno. Eu conheço aquela Manaus impressa no papel. E se é evidente a influência de Mike Mignola sobre Gabriel Bá, foi delicioso ver em seus desenhos ecos do saudoso Flávio Colin. Parafraseando a dupla, Daytripper e Dois irmãos são foda!

9- EISNER/MILLER - Charles Brownstein (Criativo, 2014)

Em 2002, durante um final de semana, o lendário Will Eisner (1917 - 2005) recebeu o não menos lendário Frank Miller em sua casa, na Flórida. Ali, os dois gigantes conversaram (e usualmente discordaram) sobre suas carreiras, quadrinhos, mercado, arte e cinema. Poucas vezes se viu um debate tão profundo e cheio de propriedade acerca das HQs quanto o que está registrado neste antológico livro. A edição da Criativo, graficamente superior à original norte-americana, desliza na tradução e no prefácio um tanto impreciso do Professor Nobu Chinen. Ainda assim, é um presente inestimável ao mercado brasileiro e a todos aqueles que se interessam seriamente por quadrinhos. 

10- MÁGICO VENTO Nos 32-40 - Gianfranco Manfredi (Mythos, 2005)

Tentaram rotular a saga de 131 edições de Mágico Vento como faroeste horror. É pouco. A epopeia do soldado Ned Ellis, que perde a memória após um terrível acidente e é adotado pelos índios Sioux, tornando-se um poderoso xamã que desconhece o homem que fora no passado, traz os limites característicos da Bonelli Editora (a mesma de Tex), tais como a obrigatória presença de um parceiro de aventuras (no caso, o jornalista Poe, sósia do escritor norte-americano) e  a disposição nada inovadora dos quadros na página. Todavia, a perícia do escritor Gianfranco Manfredi (que também é roteirista de cinema e TV, além de músico) leva a série em uma direção adulta e sofisticada, principalmente no que tange à representação nada maniqueísta da cultura indígena. Escudado por desenhistas do calibre de Pasquale Frisenda, José Ortiz, Goran Parlov e Ivo Milazzo, Mágico Vento é um fumetto comparável ao idolatrado Ken Parker. E como tal, não tem aquela babaquice caça-níquel dos super-heróis americanos, onde é impossível compreender uma história isoladamente. Qualquer edição que você pegar de Mágico Vento tem começo, meio e fim. Porém, lida em sua totalidade, a série adquire ares de grande romance americano. Made in Italy. Espero viver o suficiente para ler tudo.

11- NEXT MEN - John Byrne (Mythos, 2013)

John Byrne já foi o mais popular desenhista dos quadrinhos norte-americanos. Brilhou como ninguém nos títulos X-Men, Quarteto Fantástico, Tropa Alfa e Super-Homem. Mas as HQs estão longe de ser a mais generosa das profissões. Ondas se sucedem, turbinadas por impiedoso marketing corporativo - e o que era ouro para um geração, passa a ser lixo para a outra. Some-se a isso o desgaste natural de anos desenhando sem parar. Há mais de duas décadas Byrne não produz com a qualidade de seus tempos de glória. Tampouco faz o mesmo sucesso de outrora. Mas no início dos anos 90 ele ainda era quente e lançou Next Men pelo selo Legend (que também abrigava Sin City e Hellboy), da editora Dark Horse. Foi seu último grande trabalho. Vinte anos mais tarde, a Mythos publica pela primeira vez no Brasil um livrão coletando as 10 primeiras edições da série.

Next Men tem tudo aquilo que Byrne faz de melhor: a fusão entre ficção científica e super-heróis, desenhos vigorosos, cenários hipertecnológicos e roteiro capaz de segurar o leitor. O preço, como é de praxe na Mythos, é proibitivo: 100 mangos. Dá pra comprar quadrinho bem melhor com essa grana. Faça como eu: espere uma promoção. Vale a pena.

12- DEMOLIDOR Nos 7 e 8 - Mark Waid, Chris Samnee e outros (Panini, 2015)

Ao lado do Gavião Arqueiro, a série do Demolidor escrita pelo veterano Mark Waid é o comic book mais incensado e  premiado dos últimos anos. Não é pra menos: a concorrência é uma grandessíssima porcaria. Waid não reinventa a roda e nem tenta enganar o leitor com um suposto "conteúdo adulto". Ao contrário, ele conduz a série com apelo, suspense e simplicidade. As cores são corretas e condizentes com a arte (trocando em miúdos, você não ficará cego pelos efeitos de photoshop). E os desenhos de Chris Samnee são um espetáculo a parte. Sua clareza, equilíbrio e dinâmica narrativa remetem a mestres como John Romita e Gil Kane. Enfim, tudo que um gibi de super-herói tem a obrigação de ser. E pensar que ali pelos anos 70 e 80 quase todos os gibis da Marvel eram assim...

13 - HOMEM-MÁQUINA - Tom DeFalco, Herb Trimpe e Barry Windsor-Smith (Panini, 2015)

Taí outro gibi supimpa de super-herói, publicado originalmente em meados da década de 80. Trata-se de uma recauchutagem cyberpunk de um personagem secundário do panteão Marvel, criado pelo Rei Jack Kirby. Mas o que faz esta mini-série antológica é o retorno aos quadrinhos do magistral Barry Windsor-Smith. Após fazer história em Conan, o Bárbaro, o desenhista britânico sumiu do mapa, para voltar ainda melhor em Homem-Máquina. A capa dura e metalizada da edição da Panini são um quitute extra.

14 - MITCH O'CONNELL: THE WORLD'S BEST ARTIST (Last Gasp, 2014)

Como não poderia faltar um art book nesta lista, parti logo para o mais legal de todos: Mitch O'Connell: The world's best artist. Iconoclasta e sarcástico até falar chega, Mitch O'Connell reúne nesta deliciosa edição um apanhado geral de sua carreira de ilustrador, pintor e, eventualmente, quadrinista. Centenas de imagens do universo trash-pop do autor inundam as páginas, ancoradas em textos divertidíssimos. E se o recheio é quente, a embalagem não deixa por menos: capa emborrachada com aplique de purpurina, bordas arredondadas e um design matador que, por si só, já valeria a aquisição desta pérola. Duvido que seja publicado no Brasil.

15 - LIMIAR: DARK MATTER - Luciano Salles (Independente, 2015)

Luciano Salles vem se configurando como um dos quadrinistas mais sui generis (ou interessantes, ou pitorescos, ou estranhos, ou incômodos) da nova geração. Seus roteiros não se entregam na primeira leitura. Provavelmente nem na última. Possuem uma temporalidade enigmática, que provoca um desconforto cronenberguiano na leitura. E sua arte é acachapante, anfetaminada pelas cores de Marcelo Maiolo. Debaixo de camadas de personalidade, é possível, com algum esforço, encontrar fantasmagorias de Moebius, Mutarelli e Frank Miller (Elektra Vive). Melhor ficar de olho nesse sujeito.

16: ADORMECIDA: CEM ANOS PARA SEMPRE - Paula Mastroberti (8Inverso, 2012)

Os quadrinhos são apenas uma das áreas de atuação da artista e pesquisadora Paula Mastroberti. Entre 1988 e 1990 ela teceu para si mesma a intrincada tapeçaria que é Adormecida: cem anos para sempre. Ali cristalizou-se a paixão pelos contos de fada e pelos quadrinhos europeu de Moebius, Druillet e Crepax. Ponto para 8Inverso, que 22 anos depois conseguiu abrir essa arca secreta. Belo e atemporal.

17. PERPETUUM MOBILE - Diego Sanchez (Mino, 2015)

A lista não ficaria completa sem um livro da Editora Mino, responsável pelos lançamentos mais bacanas de 2015. Perpetuum Mobile, foi um deles. Diego Sanchez é um legítimo representante da novíssima geração de feras dos quadrinhos brazucas, ao lado de nomes como Pedro Cobiaco e Felipe Nunes. Eles têm em torno de 20 anos e chegaram sem o menor respeito, com o pé na porta. Os quadrinhos de Sanchez possuem uma atmosfera etérea, fluida, com um senso muito peculiar de disposição dos quadros na página. Ainda em 2015 ele lançaria Hermínia, um livro mais elaborado, bonito e bem estruturado. Mas Perpetuum Mobile possui uma espontaneidade que faz dele o meu favorito até o momento.  

18- A SOBREVIVENTE - Paul Gillon (Martins Fontes, 1988)

Paul Gillon (1926-2011) foi um mestre do erotismo francês. Sua arte irrepreensível, elegante e de clássico refinamento nos conduz em A sobrevivente - ficção científica pós-apocalíptica que retrata um mundo onde apenas um belíssima mulher parece ter sobrevivido. O robô da capa ficou bem feliz. 

19- GAROTA SIRIRICA - Lovelove6 (Independente, 2013)

2015 foi um ano decisivo para as quadrinistas no Brasil. Tomaram as redes sociais de assalto e fizeram um barulho gigantesco no FIQ. Não era sem tempo. A presença das mulheres como autoras e leitoras de quadrinhos é algo que precisa ser imediatamente discutido e potencializado. Como ponta-de-lança dessa agitação toda está Gabi, a Lovelove6, e sua irresistível Garota Siririca. Seu mérito? Produzir um quadrinho que é engajado, mas também divertido e instigante. Isto é, um quadrinho que sobrevive como linguagem, para além de sua função política. Gabi tem a manha.

20- O BABACA - Gary Panter (A Bolha, 2012)

Gary Panter é o pai da punk art, do desenho feio e sujo, influenciando todo mundo de bom gosto que tem atração pelo mau gosto. Fabio Zimbres é um exemplo desse tipo de gente. Gary Panter tem status de gênio no mundo das artes gráficas e é simplesmente ridículo que permaneça inédito no Brasil. Graças a Deus, temos A Bolha para tentar colocar o barraco em ordem, lançando este hilário

O babaca. Mais uma vez, muito obrigado, Rachel