A metáfora adolescente: entrevista com Rafael Coutinho

por Pedro Brandt e Ciro I. Marcondes

fotos Polyanna Carvalho

Foi com muita curiosidade que li a HQ online Backstage, assinada por Rafael Coutinho e Gabriel Góes. O primeiro é um dos principais nomes dos quadrinhos brasileiros contemporâneos, desenhista de Cachalote(a ótima graphic novel escrita por Daniel Galera) e Beijo adolescente. Góes eu conheço desde meados dos anos 1990 e sempre me impressionei com suas ilustrações e quadrinhos – nos últimos tempos, quando nos encontramos, inevitável eu perguntar para ele “já terminou o Vestido de noiva?”, me referindo à segunda parceria dele com o roteirista Arnaldo Branco adaptando texto de Nelson Rodrigues (a primeiro foi Beijo no asfalto). Espero que saia em breve! Pois foi o Góes – um dos mentores da revista Samba) – que nos deu o toque de que Rafa Coutinho passaria alguns dias em Brasília, perguntou se não gostaríamos (eu e Ciro) de entrevistá-lo. Munidos de algumas perguntas, fomos até a Laje (estúdio em Brasília onde trabalham desenhistas e artistas plásticos, e que virou uma espécie de ponto de encontro dessa galera) para o bate-papo. O chato de entrevistar caras como o Coutinho é que ele é tão gente boa que dá vontade de desligar o gravador e deixar a missão da entrevista de lado, ficar só trocando ideias, falando de quadrinhos, cinema, música, de vida, enfim. Mas acho que a entrevista manteve bastante desse aspecto informal que foi o encontro. Degravar tudo foi um parto (degravar é sempre um porre!) e depois de concluída essa etapa, a transcrição ficou perdida num limbo, numa zona fantasma entre a o excesso de preguiça e os compromissos aos borbotões. Eis que seis meses depois, finalmente colocamos o texto no ar, aproveitando mais uma visita do filho de Laerte à capital federal – ele veio dar uma palestra que faz parte da programação da exposição Macanudismo, sobre o trabalho do argentino Liniers, em cartaz até 2 de março, no Museu dos Correios, em Brasília. Por conta do atraso, alguns detalhes da conversa podem soar redundantes. Mals aê. (PB

De Bang Bang para Cachalote é possível perceber um grande salto de qualidade no seu desenho. Como você enxerga o seu desenho, está satisfeito com ele ou busca uma mudança?

O artista é muito vaidoso e o estilo é uma expressão dessa vaidade, eu acho. Quando a gente é jovem, ele vem como um objeto de autoafirmação, quase como a perda da virgindade. É o ato de precisar obsessivamente achar o meu estilo, e isso vira quase uma busca fora do desejo de desenhar ou contar história, quase como achar uma chave de entrada pra algo que você não tem.

Sempre gostei do meu desenho. Nunca tive essa relação muito vaidosa. Ficava frustrado quando alguma coisa saía muito errada, sempre fui um tanto crítico em relação a isso. E recebi muita crítica, muita gente me ajudou a ver onde estavam os meus defeitos. E você vai moldando isso aos poucos. É a busca de cada artista... desculpe, eu estou super travado...

Você acha que sofreu mais pressão por ser filho de um quadrinista famoso?

Não, mas eu sabia desde cedo o que era desenhar bem pra caralho, isso eu sempre soube. E eu queria. Acho que essa era a minha pressão maior, uma pressão que eu me colocava. Eu queria desenhar bem pra caralho. Pratiquei com mais afinco e fui devoto dessa busca mais do que outras pessoas são. E por conta de ser filho de um desenhista que trabalha com um desenho mais realista, que tem um domínio muito forte de anatomia, vocabulário visual muito extenso – que sabe fazer a porra de um barco à vela pirata de cabeça – eu me liguei desde cedo que o que compunha desenhar bem não é simplesmente saber desenhar as coisas, é tudo isso: é ter um vocabulário, é entender de anatomia, entender de estrutura arquitetônica, puxar um ponto de fuga decentemente... Eu aprendi essas coisas cedo e me pressionei pra chegar ali.

Tem algum trabalho do teu pai que te deixou mais impressionado?

Os Piratas me deixaram muito de cara, vendo ele desenhar, pensando como ele consegue. Lembro de, na infância, ficar muito impressionado de como ele sabia desenhar o Jaspion de cabeça. E ele nunca estava comigo quando eu estava vendo Jaspion. Jogar “Imagem & Ação” com o meu pai era assustador – começava de uma linha, parecia que nada se encaixava e, nos dois últimos segundos, blop, fechava um Charles Chaplin girando o mundo.

Você acha que isso é uma capacidade cerebral?

Não, prefiro não pensar nisso.

Você pediu muita dica de desenho pro seu pai?

Ele nunca me orientou, “faça isso ou aquilo”. Mas várias vezes eu perguntei pra ele como fazer as coisas. Acho que com uns 15 anos eu já estava mais interessado no que eu era capaz de fazer. Lembro de um exercício que ele me deu quando eu estava entrando na faculdade, fazer linhas paralelas com pincel. Cobrir vários papéis. Mas só lembro desses. Ele nunca me orientou. Ele nunca quis que a gente seguisse o caminho que ele seguiu.

E papo de quadrinhos?

Isso sim. Eu e meu irmão vivíamos cavando a biblioteca dele, pegando quadrinhos que visivelmente não eram para a nossa idade.

A biblioteca dele hoje ainda é a mesma?

Não, ele está numa fase de desapego. Peguei muita coisa pra mim.

Você tem essa coisa de ter quadrinhos, colecionar?

Sim, tenho uma biblioteca grande. Parei por uma questão financeira, o meu filhote... Mas tenho uns descontroles... em Angoulême que quebrei a família.

Quem dos quadrinhos efetivamente te influenciou?

Jaime Hernandez, Munhoz & Sampayo, Moebius, Katsuhiro Otomo, Jaime Hernandez de novo... ele é muito foda. Tayo Matsumoto... muitos franceses, Bastien Vives... tem uma geração argentina foda...

O seu traço tem muita identidade, e não é muito fácil sacar quais são as suas influências. Isso foi uma busca?

Foi por educação. Eu entendi lá em casa, pelo meu pai e amigos dele, que não era legal copiar. O legal é aceitar o próprio estilo. Foi em casa que eu me liguei nisso.

Cachalote tem uma narrativa muito cinematográfica. Qual a sua relação com o cinema?

Eu adoro cinema, também foi uma coisa lá de casa, vimos muito cinema de arte. Lembro, de moleque, vendo filmes japoneses... Gosto muito do Chabrol, Fellini, Coppola, Bertolucci, gosto muito dos irmãos Dardenne, Gaspar Noé...

Você pensa em cinema quando está criando?

Não como esforço consciente. Gosto de fazer umas cenas complexas, que o olho dê uma viajada, gosto do plano aberto, gosto do tempo do cinema, de o plot não precisar de fechar. Estudei roteiro muito tempo, fiz cursos, li caralhadas de livros sobre roteiro.

Existe uma característica de experimentação maior em O beijo adolescente. Você tem trabalhado a obra de maneira seriada e cada página com um conceito diferente da anterior, usando recursos diferentes. Qual foi a sua intenção ao soar experimental? Você ficou com medo de que esse excesso de informações fosse ofuscar o conteúdo da história, deixando-a difícil de compreender?

Eu gosto muito de fazer quadrinhos pensando em um desafio novo. Até porque são dois anos e meio fazendo a mesma coisa. Seria muito tempo fechado numa proposta e não sair dela. Não posso ficar pra trás dos japas, nem dos franceses. É uma obrigação moral minha. Toda vez que eu sento pra desenhar eu tenho essa neurose de fazer bonito.

Percebo que sua postura é um pouco diferente da postura de muitos dos seus colegas de geração...

Em que sentido?

[PB] Percebo uma falta de ambição. E não digo isso dos caras que já estão “acontecendo”, mas

 especialmente dessa galera que está fazendo as próprias publicações. O que você acha que poderia melhorar nessa cena de quadrinhos independentes?

Eu gosto muito dessa cena, a quantidade de gente, de propostas diferentes, jeitos de contar história. Entendo o que você está falando. Temos um óbvio problema de mercado, que limita a produção. É muito complicado abrir espaço na agenda pra fazer quadrinhos. Quadrinhos é um contrassenso, um problema pra o artista gráfico, porque você ganha muito pouco, passa muito tempo fazendo, se entrega demais para um retorno muito pequeno. É quase como ser animador. É muito ingrato e lá pelas tantas todo mundo fala “foda-se essa porra”, vou engavetar. Mas não consigo me comparar muito aos outros. A gente tem que fazer muito sacrifício pra fazer essa merda dar certo. E acho que eu dei sorte, algumas sortes: achei uma editora legal logo de cara, que me apoiou, me deu espaço pra criar, que me diz “não tá legal, refaça”, e me orienta pra caralho. Encontrei o Daniel Galera, que foi uma puta aula, e me envolvi com muita gente de outras áreas, como o Coletivo Z, um coletivo de design que eu fiz parte depois da faculdade, uns caras muito obsessivos, que iam até o final de tudo que faziam. Eu entrei e saí de vários projetos antes de fazer quadrinhos nos quais o determinante era esse: chegar até o fim. Desenvolvi um pouco esse raciocínio também: não adianta nada se eu não fizer isso muito bem e até o fim.

Você vive só de quadrinhos?

Não! Faço duzentas coisas. Tenho a Narval, trabalho três dias por semana nela, que é uma loja online de quadrinhos, do selo Cachalote. Antes disso tive uma loja física, com oito sócios. Trabalhei durante anos com animação, me acostumei a projetos longos, ver depois de um ano aquele volumão de trabalho acumulado. Faço ilustração eventualmente. Estou fazendo projetos de curadoria. A exposição do Laerte na FiQ sou eu que estou montando... Fiz uma peça agora como o meu pai. Ele escreveu e a gente bolou a coisa junto, eu fiz vários papeis, ele atuou também, tem na internet...

Você gosta de trabalhos longos...

O beijo adolescente serão vinte números... Vou fazer até os 45 essa porra.

O beijo adolescente

representa uma coisa que essa galera independente tem uma certa dificuldade em fazer, que é construir narrativas longas.

O beijo, além dos desafios de linguagem... [pensa] Eu vim de uma coisa p&b, eu queria fazer uma coisa pra um público mais jovem – embora a maioria dos compradores sejam da nossa idade – eu queria falar do adolescente moderno. Algo para o adolescente que está cansado dessas coisas doces, Mauricio de Sousa...

Você subverte esse quadrinho adolescente, fazendo uma grande metáfora do adolescente contemporâneo. Você acha que conseguiu atingir o público adolescente?

Não faço ideia. Uma escola queria adaptar, fazer uma peça, mas não sei o que aconteceu. Alguns adolescentes compraram, eu pedi pra filhos de amigos meus lerem e dizerem o que acharam, recebi umas críticas legais – eles são bem cruéis – “não gostei”, hehehe.

Você tem a história projetada na cabeça até onde?

Tenho vários pedaços, sei onde ela vai terminar e vou compondo. O Beijo veio também como uma tentativa de achar uma forma, uma alternativa, de viver de quadrinhos.

Quem tá bancando?

Eu.

E ela volta?

Ela volta... a gente fez um Catarse que deu super certo. Foi uma aula, me abriu os olhos pra essa nova era que a gente vive, que não tem intermediador, não tem atravessador, é você e o público.

Mil Quadros com Sica. Vendeu tudo?

Vendeu.

Qual a sua ideia sobre o trabalho de desconstrução dos quadrinhos que vem sendo feito no Brasil, e do qual talvez você seja a principal referência?

É o que a Samba já faz, o Sica já faz. Não fui eu que inventei, nego gosta de experimentar, de ver até onde vai a linguagem. Em algum momento eu vi muita crítica e até pensei que fosse verdade, que os quadrinhos brasileiros pecam por roteiros muito ruins, que faltava a classe dos roteiristas. O quadrinista brasileiro, quando começa, ele já tem que contar as próprias histórias. E ele não sabe, isso exige uma maturidade muito grande, mais pra contar história do que pra desenhar. E geralmente esse caras inventam um jeito de contar as histórias dele, e vai se moldando e aí nasce um jeito de contar histórias. A gente experimenta bem, o quadrinho brasileiro é anárquico, a gente não aprende anatomia na escola, não tem grandes cursos de desenho.

Mas já que a gente chegou nessa questão dos roteiros, você não acha que é uma deficiência dos quadrinhos brasileiros?

Eu acho que a gente aprendeu a contar histórias curtas, meios de histórias, e esse virou um jeito brasileiro de fazer quadrinhos, que vem do humor, que vem dos anos 50 e 60, e escoou nesses novos formatos. É quase como uma grande gag, às vezes com humor, às vezes sem humor, às vezes mais americanizadas, às vezes francesas, mais japonesas. Por uma questão também mercadológica, não se lançava graphic novel até ontem. Então, não tinha história longa. Para quem você vai virar falar, “fica aí três anos fazendo o bagulho, eu te dou R$ 2 mil. E quero uma história foda, boa sorte”. Lindo agora que estão acontecendo parcerias com escritores. Que também não são narrativas com começo, meio e fim, heróis, arquitrama bem definida, herói e vilão, não é escola americana, nem francesa, é outra coisa. É romancista brasileiro, que é outro maluco – que também levou três anos pra escrever o seu romance pra receber R$ 2 mil... 

A gente tem uma geração muito louca que nasceu dessa fragmentação, das revistinhas...

A sua formação é em artes plásticas. Uma coisa que vem acontecendo é que muitos artistas de quadrinhos contemporâneos são formados em artes plásticas e isso deu um twist na produção. O que você acha da confluência entre as artes plásticas e os quadrinhos? Aqui no Brasil isso é uma coisa relativamente nova.

Bota nessa mala aí os designers.

Sendo os quadrinhos uma arte narrativa, como você acha que as artes plásticas estão influenciando os quadrinhos no Brasil?

Acho ótimo, pois compõem o novo perfil do quadrinho brasileiro, o cara que compõe à sua própria imagem, bebendo de diferentes fontes, construindo uma coisa única, uma coisa neo-antropofágica.

Acho que não só nas técnicas, mas na concepção do quadrinho em geral, o fato de o quadrinho

 parecer um jogo, uma coisa mais contemporânea, fugir de representações mais diretas e dialogar com arte-conceito.

Acho muito foda. Eu gosto muito de um quadrinho que não tá me dando só uma história, que tá me dando um desafio de linguagem, uma nova visão, um conceito narrativo novo, não é o conceito de começo, meio e fim.

Mas você está trabalhando muito com quadrinhos narrativos.

Fiz uma história curta pra samba só com bolas coloridas. “Drinque” tem uma fragmentação, gosto de história com muitos personagens.

Ela não tem uma amarração muito clássica.

Eu gostaria de ser mais corajoso nesse sentido, eu acho que eu ainda tenho um lado bem conservador, que quer contar uma história. Sou cagão, tenho medo de perder o leitor. Medo da expectativa do outro, o que o outro vai achar. Essa expectativa...

O leitor é uma coisa que te assombra?

Eu quero que ele entenda e fique instigado em entender mais. Eu não fico pensando tanto assim no leitor. É um desejo meu de fazer coisas que me instiguem, que eu não compreenda tão bem e que ao mesmo tempo eu entenda o que estou fazendo. Nesse momento eu me espelho no leitor. Eu quero que ele seja um pouco como eu sou lendo as minhas coisas.

Você imagina O beijo como um dispositivo, com o leitor percorrendo um caminho?

No beijo eu perdi a mão, foi muito trabalho, passei mal...

Tem algo de Garagem Hermética, liberdade e criação espontânea...

Quando eu vou conversar com editores a primeira coisa que eles pedem é pra tirar todos aqueles títulos de começo de página. Eu explico que eu fazia uma página por dia, pra internet, mas mesmo assim...

Cachalote saiu na França, acho que demorou pra sair na gringa, você viu ela na França?

Na França eles publicaram no papel que deveria ter sido o papel da edição brasileira. Mas como eu pagava um puta pau pro Jaime Hernandez, eu queria aquele mesmo papel couchê dos trabalhos dele, pra conseguir aquele preto absoluto. Eles falavam que no sol não dá pra ler, que faz reflexo. Eu enchi o saco e eles fizeram. Na França eles fizeram num papel lindo. E saiu com o dobro de tamanho. Me envaideceu todo. Ficou linda.

E como foi o encontro com Daniel Galera

A gente se conheceu na noite em que pensamos em fazer o projeto. A Cia ainda nem tinha o selo de quadrinhos. Fomos falar com o Conti, o “menino dos quadrinhos”. Ele era um editor júnior na editora e queria fazer um selo de quadrinhos.

Como era a dinâmica?

Foram dois anos e meio, fomos ficando amigos nesse meio tempo. Ele morou um ano em São Paulo e depois foi pra Garopaba.

Foi tudo muito fluido. Ele quase desenhou comigo e eu praticamente escrevi com ele. Eu mandava trechos de histórias. A gente fez tudo por etapa. Ele é sistemático que nem eu.

Escrevemos um pré-roteiro, com as premissas dos desenrolares, só com os indicativos de diálogo, depois thumbnails. Com o mapinha do primeiro texto, comecei a esboçar. Na medida em que a gente ia escrevendo o segundo, ele foi me orientando, foi bem junto. Várias ideias visuais foram dele.

A Cachalote saiu vendida já com direito pra audiovisual, pela RT Features. Uma empresa que foi muito parceira na Cachalote e em outros projetos meus. O Rodrigo é um visionário, baita parceiro, comprou os livros do Galera e do Grampá, O campo em branco, Vanessa Bárbara e Fido. A RT deu uma turbinada nessa cena de graphic novels.

Imagina saindo um filme?

Seria ótimo. Vai sair uma peça, do Murilo Rouser, parceiro do Filipe Hirsch.

Achei do caralho o quadrinho que você fez com o Góes. Pretendem continuar?

Aquilo foi uma encomenda da Lion BD. Eles têm um pré-roteiro de tudo, tem que acontecer algumas coisas, tinham ganchos para as histórias. Eu não ia conseguir terminar a tempo, então numa breja eu conversei com o Góes.

Foi ela que disparou o meu desejo de fazer parcerias.

A gente se internou três dias e ficamos fazendo as 10 páginas.

E os próximos projetos?

Men Sur, Beijo 3, projetos da Mil, algumas coisas do Laertão, a Lola, um catálogo de dias do ano do Laertão, tenho um projeto de pintura que chama Fogo Fácil, que eu estava fazendo com uma galeria. Tem um curta que eu co-dirigi com o Pepe, um baita amigo. Fazer 24 telas. Acabei de sair da minha galeria, estou procurando outra. E ficar com o meu filhão.

O beijo parece se alternar entre como os adolescentes conseguem interferir no mundo atual, e ao mesmo tempo lança um olhar crítico sobre como eles tem dificuldade de entrar no mundo adulto. O que você pensa sobre isso? E o que isso se diferencia de quando você era adolescente?

É maravilhoso ver o que eles estão fazendo, e ao mesmo tempo tem muita coisa idiota. Descobri que a nova geração fala muito mais inglês no meio das frases, são mais americaninhos, viram mais séries. Esse papo pode ir longe. Acho que a nossa geração morre de medo de crescer. Caiu por terra umas premissas básicas. Você não precisa ter um carro, você não precisa comprar uma casa. Então outros planos apareceram. Ter uma identidade fragmentada. Até 20 anos atrás era uma coisa consolidada, sujeito que define objeto, hoje o contrário.

Leu Stuart Hall?Li o Bauman.

Minha mulher fez um mestrado sobre isso, então chupei muito disso aí. Entendi isso, até o começo do século passado, o sujeito definia o objeto, hoje é o objeto que define o sujeito. Hoje o sujeito troca de identidade como troca de roupa. Muda de opinião. São eles (os adolescentes) que estão dando o caminho. Somo seres fragmentados. A questão pós Bauman e

Lipovetsky

. Talvez a gente esteja olhando a sociedade como algo sacro que poderia ser conservada...

O seu quadrinho trabalha os super-heróis como uma metáfora. Qual sua relação com os quadrinhos de super-herói? E qual a relação do adolescente com o super-herói?

Li durante uma ano na adolescência. Depois comecei a ler Akira – o que não me levou pro mangá, só pro Akira. Aquilo é muito moderno, com uns adolescentes muito filhos da puta. E a vida era muito real, tinha um medo muito eminente.

O beijo é mais uma resposta ao Katsuhiro Otomo do que aos super-heróis.

Você teve algum receio de que O beijo, em toda sua riqueza artística, recaísse num excesso de camadas e estímulos? Que o conteúdo acabasse esmagado?

Não estou disposto a abrir mão disso. Fiz O beijo pensando num público idealizado, quase como se estivesse sob influência surrealista. Daqui a dez anos os adolescentes vão entender.

[CIM] Na minha opinião o volume dois é mais doidão, tem saltos mais radicais. Me interessou formalmente, possui um uso versátil de cores. Acho que ainda está se formando enquanto narrativa, ainda há uma certa dificuldade em se afeiçoar aos personagens. Acho que alguma coisa se perde entre as páginas. Tenho a percepção de incompletude. Não consigo compreender lendo apenas esses dois.

Em relação ao projeto 1000, por que a opção pelo silêncio? Como ficam os quadrinhos sem as

 palavras?

Boa pergunta, não sei. Muito se diz sem palavras. Acho que vem da minha vida, sou muito verborrágico. Mas muitas reflexões foram em silêncio, coisas não ditas, eu nem saberia dizer o que aconteceu. Tenho essa sensação de que existe uma coisa maior quando internamente acontece. Uma coisa entre os nossos atos e nossas falas e que conduz a gente ao que poderia ser chamado de destino, a conclusão da vida.

Eu perdi um irmão há oito anos e aquilo foi bem forte pra mim. Foi um momento de reflexão aguda, profunda, muito doida, até hoje.

Acha que isso reflete nos seus quadrinhos?

Acho que sim, no playboy que vai pra Europa. Minha mãe morava lá. Viajei muito por lá. Foi muito importante pra mim, ficar sozinho, perder o controle racional que a gente tem das nossas vidas, que a gente projeta sempre cartesianamente como uma narrativa de começo, meio e fim. Existe uma beleza de quando você perde a mão desse controle e deixa que as outras forças ao seu redor conduzam as emoções e atos. Pra mim isso é muito presente, queria que fosse mais, não tenho habilidade de colocar isso numa história. Por isso que eu fiquei tocado pelo livro do Emilio e do DW.

Coisas indizíveis, que conduzem a nossa vida, que acontecem no coração, que ninguém vai saber. E a arte é a melhor ferramenta pra expressar essas coisas.

STRIPBURGUER e os quadrinhos do Leste Europeu


A Bolha Editora, que teve textos sobre seus quadrinhos aqui na Raio Laser, tem feito um bom trabalho trazendo HQs de outras nacionalidades ao Brasil e publicando autores independentes. Entre coisas difíceis de se encontrar, como as Tijuana Bibles (quadrinhos pornográficos que tiveram circulação dos anos 20 aos anos 60, e que utilizavam personagens como Popeye e Dick Tracy), ela traz também quadrinhos que foram editados originalmente pela STRIPBURGUER, editora eslovena de quadrinhos alternativos que tem como ideia publicar artistas do mundo todo, entre eles também brasileiros, como Dw Ribatski, Allan Sieber, Jaca, etc. Dentre as edições distribuídas pela Bolha Editora, tive a felicidade de encontrar por aqui  Stripburek, em que eles fazem uma compilação de quadrinistas do Leste Europeu a fim de apresentar para o mundo pessoas que têm uma perspectiva diferente a oferecer. Nos Estados Unidos, por exemplo, este material foi distribuído pelo pessoal da Top Shelf, editora conhecida por publicar Do Inferno e Liga Extraordinária, do Alan Moore.

Pessoalmente, amo quadrinhos alternativos e contemporâneos e, quando posso, confecciono os meus próprios, e faço sempre o possível para conhecer o underground de outros países, como fiz em minha viagem ao Chile, e pretendo fazer em minha próxima viagem. Como viajar ao Leste Europeu ainda é um sonho distante, tenho que agradecer imensamente à Bolha Editora pela distribuição desta pérola que nos faz ter uma compreensão profunda a respeito do que estes quadrinistas acham sobre cultura, política, e dia-a-dia do Leste Europeu. São quadrinhos de autores nunca antes publicados no País.

É engraçado perceber que diariamente recebemos álbuns e revistas de quadrinistas norteamericanos, franceses, belgas, italianos e japoneses em nossas livrarias e bancas de todo o país, mas raramente ocorre de recebermos material de um local verdadeiramente diferente, como esta compilação da Europa Oriental. É difícil imaginar como são estes países, que para tanta gente fazem parte da África, ou que alguns pensam ser algo como “árabes”. Porém, há muita vida cultural em meio a todo este continente cinzento, que só agora tem virado roteiro de viagem pelos os turistas mais curiosos, à procura de paises belos e com hospedagem barata, fora do eixo Paris-Londres.

No álbum Comics from other Europe temos uma visão diferenciada do mundo e do tempo aonde se passam estas histórias, que, com várias páginas ou apenas uma, são muito interessantes por proporcionar a visão destes autores, que se expressam por meio de temas que vão desde a guerra até o cotidiano. Coisas como a história mais conhecida, onde rebeldes contra uma Alemanha nazista encontram um ganso que bota ovos de ouro. Nas piadas com o Superman, temos uma visão interessante destes fatos, fora da ótica de heróis americanos, o que é geralmente o mais comum. Quadrinhos non-sense estão presentes também, aumentando as páginas esquisitas do livro.

É engraçado encarar que Stripburek já previa esse interesse pelo Leste Europeu em pleno inicio dos anos 2000, e que tenha levado 13 anos para ser publicado aqui. Existem, é claro, artistas conhecidos no ocidente, como Edvin Biuković, Zoran Janjetov, Grzegorz Rosiński e Enki Bilal. Porém, muitos artistas ainda permanecem incógnitos em nosso país. Entre eles:

Aleksandar Zograf (pseudônimo de Sasa Rakezic): sérvio, teve seus quadrinhos publicados (dentre eles “Weirdo” e “Zero Zero”) nos Estados Unidos pela editora Fantagraphics. 

Danijel Zezelj: croata, que ficou posteriormente conhecido em seus trabalhos no selo Vertigo, tendo feito edições em Vampiro Americano, Terra Sem Lei, sendo substituto de J.H. Williams na série Desolation Jones

Jacek Fras: polonês, ganhou prêmio na categoria de novos talentos em Angoulême. 

Askold Akshin, que faz várias colaborações no meio underground, incluindo uma coletânea sobre histórias de Zumbis, estas publicadas nos EstadosUnidos

Igon Baranko: ucraniano, mora nos Estados Unidos, colaborou com Alejandro Jodorowsky na revista Métal Hurlant, e trabalhou em seu próprio quadrinho autoral, The Horde, que foi comparada com o estilo de Jodorowsky, em uma historia que se passa em 2040, na Rússia. 

January Misiak: polonês, publicou diversos trabalhos no leste europeu, inclusive nas coletâneas StripBurger. Publicou um livro chamado Siedem tygodn ou “Seven Weeks”. 

Pavel Cech, da República Tcheca, ilustrador de diversos títulos

Milorad Krstic, da Eslovênia, artista plástico, tem um estúdio aonde faz montagens com fotos de pessoas e pinturas. 

Roman Tolici, outro habilidoso artista plástico, nascido em Ghetlova, antiga União Soviética. Formado na Romênia, alcançou conhecimento em todo o mundo com suas séries de pinturas realistas. 

Sasa Kerkos, artista da Eslovênia, que também trabalha como design, e que lança quadrinhos também pela Stripburger.

É interessante ver que apenas os mais conhecidos dos cartunistas deste bloco europeu se tornaram conhecidos por aqui, ou nem isso. Conhecido como rei dos quadrinhos da República Tcheca, Kája Saudek ainda permanece no anonimato entre nossas publicações, e, em seu próprio país, apesar de publicar de maneira underground durante toda a década de 70, só foi oficialmente publicado no final da década de 80, com o fim da União Soviética, tendo depois conseguido sustento quando entrou na carreira de quadrinhos pornôs.

É um complicado mundo, os dos quadrinhos do leste europeu, e é um mundo totalmente novo, onde existem países em que a tradição de fazer quadrinhos só começou nos anos 80, e de países que saíram da guerra recentemente. Apesar disso, houve gente que batalhou e enfrentou guerras, para, enfim, publicar quadrinhos.


Guerra Civil: o irreversível ocaso dos super-heróis

Guerra Civil: o irreversível ocaso dos super-heróis

Certo dia, quando estava elaborando algumas linhas de pensamento para escrever um texto sobre a série Guerra Civil, da Marvel, que estava lendo no momento, eu adormeci. Curiosamente, estas elocubrações bem conscientes e planejadas acabaram transformando-se no mundo absurdo e sem rédeas do sonho. Não tão exótico, mas significativo: um sonho de voo. Este tipo de sonho não é novidade para mim. Desde criança sonho que possuo a habilidade de voar, seja flutuando como um astronauta, dando rasantes como um jato, ou vertendo o céu aberto, como um super-herói. A quantidade de vezes em que mergulhei na experiência do voo (que é contagiante e prazerosa) me fez ter sonhos continuados a respeito deste assunto. Se, em um sonho, eu estava desajeitadamente aprendendo a voar, no seguinte eu já tinha domínio e podia me exibir narcisicamente para as outras pessoas. Depois de centenas de sonhos deste tipo, me tornei um mestre na arte do voo, e passei a uma nova etapa: desenvolver uma ciência do voo, que é refletir, durante o sonho, sobre a habilidade técnica de voar, sua natureza e limitações, etc. A ciência do voo, por sua vez, me despertou para pensar numa ciência do super-herói.

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A influência dos gibis na minha paixão pelos livros e outras histórias




Volta e meia, nós da Raio Laser pedimos para amigos nossos escreverem sobre suas experiências como leitores de quadrinhos. A maioria não topa o desafio. A justificativa para a negativa seria um pretenso pequeno conhecimento sobre o universo das HQs. Insistimos dizendo que nesses casos não procuramos textos de especialistas, também nos interessa saber o que pensa o leitor comum, aquela pessoa que já leu quadrinhos mas não tem uma relação tão próxima, intenção ou aprofundada sobre o assunto. Queremos conhecer as memórias afetivas, as impressões instantâneas, os causos pitorescos. O primeiro amigo a topar a empreitada foi nômade bon vivant Leonardo Messias. O segundo é o jornalista brasiliense (anapolino de nascimento) Lúcio Flávio Silva. Apreciador do bom rock e do bom cinema, Lúcio edita um blog muito bacana no qual fala de suas paixões e expurga alguns demônios. Tudo de maneira bastante despojada e pessoal, por vezes bastante intimista, sempre com contornos interessantes e dicas valiosas. No texto a seguir, Lúcio Flávio comenta como os gibis lidos na infância serviram para ele de ponta para a literatura e ainda revela como esse contato germinou uma eterna simpatia pelos quadrinhos. (PB)

por Lúcio Flávio Silva

Houve um tempo, em algum lugar da minha infância, que os sábados não eram apenas dias santos, mas um estado de espírito mágico materializado em nossas visitas à banca de revista mais próxima de casa naqueles passeios matinais com papai. O coroa, sempre protegido do sol com sua boina estilo Pablo Neruda, trazia debaixo do braço a feira do dia e o jornal da semana, enquanto que eu e meu irmão gêmeo nos deliciávamos com os gibis de nossa predileção que ele comprava. E assim, mês a mês, nossa coleção ia aumentando consideravelmente. 

Bem, digam o que quiserem sobre os malefícios da leitura de quadrinhos, da má influência de Walt Disney sobre várias gerações, de milhares de bobagens do tipo. Mas o fato é que, bem antes de Monteiro Lobato e coisas do gênero, aprendi a gostar de ler mesmo foi com Pato Donald e o Mickey Mouse, Tio Patinhas e os seus sobrinhos, com a turma da Luluzinha e claro, com o Maurício de Sousa e seus personagens marcantes.



E, mesmo que não soubéssemos ainda, de uma forma ou de outra, estava tudo lá, nas entrelinhas lúdicas dos quadrinhos, influências de um Molière, das aventuras de Alexandre Dumas, dos desafios científicos de Júlio Verne e H. G. Wells, do submundo das tramas policiais delineadas pela narrativa elegante dos escritores Dashiell Hammett e Raymond Chandler e, veja só, até mesmo Shakespeare. Sim, ou você acha que personagens como o avarento Tio Patinhas e seus corajosos mosqueteiros Huguinho, Luizinho e Zezinho, assim como o inventivo Professor Pardal e os mal-intencionados irmãos Metralhas, entre outros, surgiram de onde?

Como diria o velho poeta maranhense Ferreira Gullar, citando a influência da obra de Le Corbusier no trabalho de Oscar Niemeyer: “Na cultura, assim como na vida, tudo é herança e transformação”.

E dos gibis da turma da Disney, da Luluzinha e da Mônica para os livros de Monteiro Lobato e outros clássicos da literatura infanto-juvenil comAlice no país das maravilhas, O pequeno príncipe, O menino do dedo verde, Meu pé de laranja-lima, entre outros, foi um pulo. Contudo, ainda perduram em algum lugar de minhas recordações infanto-juvenis, aquelas tardes gostosas de sábado e domingo com cheiro de café quente e petas da minha mãe, misturados com as páginas surradas dos meus gibis. Pilhas e mais pilhas de gibis que não sei onde foram parar depois.

Fragmentos de algumas dessas leituras até hoje pairam em meu inconsciente fosse pelo forte caráter social, político ou existencial, embora na época eu estivesse longe de saber o que significava essas coisas todas. Não me esqueço, por exemplo, de uma crítica à ganância e ao capitalismo desenfreado num episódio em que, na medida em que o Pato Donald ia subindo de status numa empresa, seu espaço no estacionamento acompanhava o bem sucedido desempenho profissional dele, simbolizado pelo materialismo. Assim, logo, logo aquela reles e sucateada bicicleta de entregador que ele pedalava no início da história, para cima e para baixo, era substituída por um carro mais aconchegante, e mais outro e outro, até chegar a uma lustrosa limusine.

Numa história do Maurício de Sousa, um personagem vive em agonia com o latente medo de tudo que sente. De não conseguir emprego, de andar sozinho pela rua, de não conseguir ser alguém na vida, de ficar doente, enfim, de morrer. Um dia, a Morte, em osso puro, lhe faz uma visita e o leva embora para o além-mundo e lá está ele a sete palmos do chão, para desespero da Senhora Foice, reclamando do medo de ressuscitar. E olha que estamos falando de um singelo quadrinho de Maurício de Sousa. Mais barra pesada impossível.

Daí veio a fase dos super-heróis e era um tal de barganhar gibis do Homem-Aranha, Super-Homem, Capitão América, Hulk, Homem de Ferro, e claro, Batman, meu preferido, com os colegas do colégio. Além de economizar uma grana, valia pela troca de experiências sensoriais e impressões afetivas de cada um.

Lembro que dessa fase, o maior ato de rebeldia ou quem sabe coragem que cometi foi chegar em casa um dia, para desespero da minha mãe, com uma revista do Conan, o Bárbaro enrolada sorrateiramente debaixo da camisa. Tudo isso para a coroa não se assustar com os traços sensuais das personagens baseadas na literatura de Robert E. Howard e as musas do crimeriano cheias de desejos. Um estratagema usado por pura vergonha que não funcionou, mas que com certeza, foi uma experiência bem menos traumática do que eu me decepcionar com a silhueta do bárbaro nos quadrinhos. Sim, porque eu não me conformava com o fato do personagem criado nos anos 70, não ter a cara do Arnold Schwarzenegger das telonas. Fazer o quê, como disse os meninos dos Stones, a gente nem sempre consegue tudo o que quer.


Nos últimos anos, motivado por experiências amorosas frustradas e momentos familiares mágicos, tenho me dedicado, não sei por que, com mais afinco, à leitura de clássicos como Calvin e Hobbes, Snoopy, Tintim e Malfada, esse último o predileto lá de casa, dividido entre tapas com minha sobrinha-afilhada. Não há como não se encantar com a urgente ingenuidade da menina Mafalda.

Bom, tenho muitos amigos que são profundo conhecedores de quadrinhos por aí, verdadeiras bibliotecas e enciclopédias ambulantes sobre o assunto e às vezes, me envergonho e sinto constrangido de não ter o conhecimento que eles têm no seguimento, com as observações sofisticadas e perspicazes sobre mangás, autores conceituados no gênero como um Robert Crumb ou Will Eisner e tantos outros. De modo que só me resta uma grande admiração pela turma.

* Este texto foi escrito ao som de: Out here e Roadmaster (Love/1969 – Gene Clark/1972)

HQ em um quadro: Jodorowsky for kids, por Arno e Jodorowsky

Holibanum, Alef-Thau, Diamante, Malkuth e Hogl... caem (Jodorowsky, Arno, 1989): Certamente não é recomendável escrever sobre uma obra da qual constam oito volumes e que atravessou duas décadas tendo-se lido apenas um deles, mas, apesar de em alguma instância isso aqui consistir nisso mesmo, tentarei fazer o possível para que este possa ser um texto honesto. Afinal, é função da seção "HQ em um quadro" capturar algo de essencial nos quadrinhos a partir de uma única imagem, e resolvi tornar esta pequena reflexão desafiadora justamente por esta dificuldade. De qualquer forma, confesso que comprei essa HQ pelo preço 1 (um) Euro, numa promoção da incrível Elektra Cómics em Madrid, e não sabia que era o miolo de uma série grande. A ideia aqui é atingir o âmago desta história de maneira volátil, rápida, e se possível, certeira. O que vemos aqui são cinco personagens da série "As aventuras de Alef-Thau"... caindo. Esta cena está no Volume 5 da saga: El Emperador Cojo (em espanhol); L'Empereur Boîteux, no original. O contexto da imagem merece uma linha: o grupo cai porque foge, através de um rio, de uma infestação de "vírus hipertrofiados" que consome tudo que a circunda. No final das contas, eles caem num local seco, porque a presença da imortal Diamante faz desaparecer tudo que tenta matá-la, incluindo o rio e os vírus. A paisagem é de um colorido vívido e claro, e as formações rochosas são lindas, angulosas e fluidas, algo como a Chapada dos Veadeiros aqui no DF. A geologia e a botânica do mundo mágico é um dos atrativos desta HQ. Parece uma maluquice? Pois bem-vindo ao mundo de Alejandro Jodorowsky, o inimitável criador desta história. Selecionei este quadro com os cinco aventureiros porque ele parece expressar, de maneira metonímica, os componentes básicos deste universo: senso de aventura, o sentimento do companheirismo, o risco constante, o mundo fantástico, a chance ao improvável. O que chama a atenção nesta série é o fato de o grande Jodoroswky, autor de filmes incríveis, como A Montanha Sagrada (chancelado por John Lennon) e El Topo, e da enormemente cultuada série Incal, com Moebius, ter escolhido trabalhar, paralelamente à sua obra-prima, nos anos 80 e 90, com uma série de fantasia quase infanto-juvenil, elaborada no traço límpido (quase linha-clara) do desenhista Arno. "As aventuras de Alef-Thau" pode não conter as reviravoltas catastróficas, os desdobramentos metafísicos, a inflexão religiosa e as culturas intensamente alienígenas do Incal, mas certamente guardam seu valor. Para situar o leitor: "Alef-Thau" se passa um mundo ilusório (?) de fantasia que é na realidade um jogo (literalmente) entre os chamados imortais. O personagem principal e título da saga, uma figura élfica, começa como um aleijado sem braços, nem pernas e nem perspectivas, que vai ascendendo espiritualmente enquanto seu corpo se recompõe, membro a membro.

Se a história parece insólita, tenho certeza de que não soará tão estranha àqueles já familiares ao universo do Jodorowsky. Cineasta, quadrinista, mago, ator, mímico, dramaturgo, tarólogo. A tudo compete este homem. Suas obras são mergulhadas numa busca por transcendência, onde figuras que se tornaram signo de alteridade, como bruxos, aleijados, anões e assassinos, buscam sua própria forma de redenção mística. Cabalismo, sociedades secretas, hermetismo e bruxaria não são elementos estranhos à ordem cósmica estabelecida por Jodorowsky, e eles podem aparecer tanto no passado distante ou inexistente (caso da fantasia de Alef-Thau) quanto no futuro cyberpunk pós-apocalíptico (caso de Incal). Seu interesse pela moralidade e pelo limiar da sexualidade rendeu também outras obras clássicas, como Os Bórgias (com Manara) e La folle du sacré-couer (também com Moebius). Mas o que parece ser mais primordial na obra deste grande mestre é sem dúvida o aproveitamento de uma estética surrealista como foco de resistência: a uma tradição narrativa ordinativa, bestializante e ilusória; a uma ordem lógica racionalista do pensamento, francamente aprisionadora; a uma série de barreiras psicológicas e espirituais que impedem o desabrochar de um inconsciente livre, totalizante, produtor de um verdadeiro self.

Alef-Thau traz estes elementos de maneira leve, aventureira e contagiante, como se fosse O Senhor dos Anéis que tivesse tomado, digamos, um quarto de ácido. A série é ajudada pelo desenho luminoso e super colorido de Arno, grande ilustrador que, por sinal, faleceu em 1996 e veio a aparecer como personagem na continuidade da série (coisas de Jodô). Mesmo assim, Alef-Thau não é desprovida de enredamentos instigantes, lisérgicos, non-sense ou, em última instância, completamente incompreensíveis, tais como, apenas na edição que eu li: 1) uma personagem, Malkuth, que se suicida transformando-se em energia vital para vir a ser... a nova perna de Alef-Thau. 2) uma cidade habitada apenas por pessoas feias, defeituosas ou velhas, que foram expulsas do celestial Reino do Centro Maestro, lugar encantado que aceita apenas pessoas "perfeitas", pois que seu ideal máximo é a beleza. 3) uma personagem-imortal (Diamante) que morre e renasce como um bebê que simplesmente...cresce muito mais rápido que todo mundo e logo é uma adolescente madura que pode procriar com... Alef Thau. A lista poderia prosseguir em torno de viagens astrais e monstros gigantes. Não o faremos, mas resta pensar, em primeiro lugar, na fertilidade de produção de uma mente febril e absolutamente desvinculada de qualquer premissa clássica que é a de Jodoroswky. E, em segundo e último lugar, em quão longe podem ir as HQs e a ficção em geral para adolescentes, e em quão rasos estes produtos realmente são em suas versões mais populares (literatura de vampiros, filmes de super-herói, séries de zumbis... melhor parar por aqui) . (CIM)    

Horror à brasileira

por Ciro I. Marcondes

Revistas de terror brasileiro sempre me provocaram, desde a infância, um temor incômodo, inefável, de alguma maneira lovecraftiano: são páginas que perturbam a consciência antes mesmo de serem abertas. Como a menção do Necronomicon em Evil Dead, basta uma vislumbrada na capa para que um sujeito seja atormentado por noites e noites sem dormir. Como em Lovecraft, no meu imaginário, o terror destas revistas advinha daquilo que ocultavam, e não do que revelavam. Se, por acaso, de alguma forma eu quisesse abrir aquelas caixas de Pandora, um vislumbre de rabo de olho naquelas formas demoníacas, naqueles seres canibais, bestiais, e, talvez principalmente, naquela exótica e esotérica associação entre monstros, psicopatas, assassinatos e sacrifícios com mulheres belas e nuas, atos sexuais selvagens e toda forma de erotismo, tudo aquilo era capaz de criar uma paradoxal relação de temor absoluto com fascínio, atração, talvez obscura lascívia. 

O terror no quadrinho brasileiro data especialmente (mas não só) dos anos 50, e teve longo reinado. Foram dezenas (talvez centenas) as publicações nacionais dedicadas ao gênero, que teve seu auge nos anos 60 e 70. Vale registrar as revistas Sobrenatural, Pesadelo, Calafrio, Mestres do terror, além da própria Spektro, que é tema deste texto. No início, houve a importação de material vagabundo americano (o exímio material da EC só veio a aparecer por aqui nos anos 90), que também estava em voga até a caça às bruxas de meados dos anos 50, em títulos como Terror Negro, Gato Preto e Sobrenatural. Depois, com a censura do material americano promovida pela campanha de Wertham, o material estrangeiro deu uma refugada, o que permitiu que se abrissem as portas ao material nacional e seus clássicos autores, muitos deles estrangeiros radicados no Brasil, como Rodolfo Zalla, Jayme Cortez, Eugênio Colonnese e Nico Rosso. Históricos ilustradores brasileiros despontaram: Flávio Colin, Júlio Shimamoto, Ofeliano. A história é muito longa e cheia de desdobramentos para ser contada aqui. O que importa é que em 1977 estreia, pela editora Vecchi, Spektro – a revista do terror, e, em 2013, uma Spektro veio parar em minhas mãos. Nas palavras do mestre Moacy Cirne: “A revista Spektro, enquanto foi publicada, constituiu-se, a partir do número 2, em nossa principal publicação de terror, desde os tempos heroicos da Editora Outubro”.

A capa: desenho de Ofeliano

A edição número 15 de Spektro (de 1980) me trouxe a oportunidade de abrir a velha caixa de Pandora e me defrontar com aquela curiosidade auspiciosa despertada em mim por estes quadrinhos na infância. Os temas continuam aterradores. As visões, passados anos, ainda perturbadoras. São todo tipo de demônios, pactos sangrentos, mortes perturbadoras, rituais de sexo e sangue, e até curiosidades como um conto obscuro de Balzac e uma história sci-fi ilustrada por ninguém menos que John Byrne! Nem tudo de primeira. Muito material é claudicante, sem ritmo narrativo, com finais abruptos e forçados, arte primária, coisas muito gore e desnecessárias. Mesmo assim, vale lembrar uma história de demônios esotéricos, tirada de cordel, ilustrada por um jovem e promissor Watson Portela; um clássico de “cangaceiros do inferno”, por Gustavo Augusto e Antonino Homobono; e um monstruoso conto de seres reptilianos, por Fernando Silva.

Spektro e os espelhos

Porém, o que me motivou a escrever este texto foi certamente a história que abre a edição, chamada “A casa dos espelhos”, não apenas por reunir quase uma espécie de dream team do quadrinho brasileiro de terror, mas por referenciar um tema de fortes conotações metafísicas, de macabro horror psicológico, ligando, sob uma mesma teia, coisas como visões infernais especulares, suicídios, orgias e guerras. Aqui, mais distante do compêndio trash/gore/erótico que caracteriza as outras histórias, encontramos um verdadeiro aprofundamento na fisiologia e psicologia primárias do terror. 

Um jovem e macabro Watson Portela

Supostamente baseada nos relatos jornalísticos (verdadeiros... e sabotados) do misterioso Jonas Beltron, que “era escalado pelo editor do extinto jornal ‘A noite em notícias’ para cobrir os mais fantásticos casos sobrenaturais” (segundo o clássico editor da Spektro, Otacílio d’Assunção, o velho Ota), “A casa dos espelhos” é um mosaico de histórias insólitas envolvendo interessante moldura: o próprio Jonas Beltron aparece como personagem para visitar uma sombria mansão com salões e quartos obsessivamente recobertos por espelhos, carregada de um passado com inquilinos sombrios, com o objetivo de entrevistar o único morador sobrevivente – o caquético mordomo Juvêncio.

O texto da HQ é de Basílio de Almeida, e ela é ilustrada por Shimamoto (na sequências da moldura), Watson Portela, Flávio Colin e H. Yoshinobu (aparentemente, um pseudônimo do próprio Shima). Em todas as terríveis histórias relatadas pelo mordomo, a presença dos espelhos surte um efeito diferente, revelando um aspecto novo como possibilidade de representação do terror. Na primeira, desenhada por Watson, por exemplo, emerge o aspecto sobrenatural, quando nos é apresentado o casal que construiu a casa: um magnata do comércio e “uma mulher vaidosa e narcisista que teve a ideia dos espelhos”. A história se torna lúgubre e ao mesmo tempo exoticamente atraente quando a vaidosa esposa, abandonada sexualmente pelo impotente marido, passa a buscar saciação com uma criatura demoníaca, de aspecto felino, que atravessa os espelhos para sugar seu sangue e fazer sexo com ela. 

O espelho: fragmentador da subjetividade

A menção, no texto da HQ, a uma mulher “narcisista”, por pulp que seja, não aparece à toa. O contato com o espelho, construtor de um mundo simbólico e outro imaginário, segundo a psicanálise de Jacques Lacan, é o que fabrica, na primeira infância, nossa identidade narcísica, aquilo que nos constitui enquanto fantasia de sujeito. A mesma imagem especular, prismada em fantasmas e doppelgangers (duplos de nós mesmos no mundo) será responsável mais tarde não por nos unificar, mas por fragmentar nossa consciência, trazendo à tona o medo da morte, do esfacelamento da identidade e da subjetividade. A figura de um duplo, tão bem representada em qualquer espelho, será não mais um signo de configuração de nossa presença no mundo, mas um aviso terrível de nossa desintegração. Um mesmo dispositivo é acionado para nossa pulsão de vida (Eros) e de morte (Thanatos), e daí certamente vem a associação tão comum entre o terror e o erotismo: ela revela a relação íntima entre nosso instinto de criar e destruir, de amar e matar, como lados de uma mesma moeda. 

O virtuosismo de Shimamoto

Os outros “causos” de “Casa dos espelhos” corroboram estas ideias. E com bônus: se a arte de Watson Portela é ainda muito primária e com pouca mobilidade na primeira história, na segunda, desenhada pelo tal “Yoshinobu” (nome do meio de Shimamoto), temos acesso a uma arte de terrível (no bom sentido) expressionismo, com ângulos virtuosos e um riscado diagonal, aproveitando o ciaroscuro, que tornaram célebres os desenhos do nosso ilustrador de origem japonesa. Também a história ganha em densidade dramática, quando acompanhamos um outro morador da casa, refugiado da segunda guerra e ex-colaborador nazista, que precisa injetar drogas na veia para poder dar vazão a bad trips escapistas, torturantes e avassaladoras. Já sem a afetação do espelho como passagem para um duplo maligno e diabólico, aqui a tensão se dá entre a solidão claustrofóbica do junkie e a reverberação de suas alucinações no espelho. Shima usa hiper-closes, zoom, vortex e diversos recursos gráficos diferentes para detalhar com exuberância o enclausuramento macabro do colaborador, que acaba se suicidando no final. 

Os playboys dos episódio de Colin

A cereja do bolo, no entanto, fica por conta de “Juventude transviada”, o capítulo de “A casa dos espelhos” ilustrado pelo magnífico Flávio Colin. Para quem ainda não conhece, Colin é um dos mais frutíferos e inovadores ilustradores brasileiros de todos os tempos, tendo atuado até os anos 2000. Seu estilo, icônico, pendendo ao cartunesco, é inconfundível, tendo sido pioneiro em uma época em que o realismo figurativista estava muito mais em voga nos quadrinhos. Não à toa, pode-se dizer que ele se adianta a desenhistas como Mike Mignola ou Mike Allred no sentido de verter os quadrinhos para um patamar mais minimalista. Seu capítulo em “Casa dos espelhos” é também um dos mais brutais: a casa, desta vez, é alugada por um grupo de playboys que passam noites fazendo orgias de sexo e drogas dentro do salão principal da casa, até que um deles começa a surtar e comete um assassinato à queima-roupa. Este acontecimento leva a uma série de outras atrocidades, incluindo roletas russas e torturas, até que todos na casa estejam devidamente mortos no momento em que são encontrados pelo porteiro Juvêncio. O tratamento do roteiro, por mais que peque um pouco no quesito do moralismo, é absolutamente frio e observacional, transformando a experiência, para o leitor, em algo ao mesmo tempo voyeurístico e perverso.

Colin: estilo minimalista

A assombrosa maturidade destas histórias me leva a pensar na imensa quantidade de outras boas publicações em quadrinhos que estão perdidas por aí, décadas depois de sua edição original, sem oportunidade de serem lidas pelo cada vez mais assíduo público leitor de quadrinhos no Brasil. Fica claro que precisamos urgentemente de republicação deste material, em impressões e papel de qualidade devida. Em uma só história encontramos elementos do horror metafísico, do horror do sexo, do horror da guerra, do horror do vício, do horror bestial da juventude e do horror do autorreconhecimento. Não faltava originalidade de ideias, nem um approach artístico e nem uma estética propriamente dita a estes quadrinhos. De alguma forma, a ideia do espelho fica aqui para lembrarmos que precisamos reconstruir a imagem e a história das nossas publicações e traçar enfim uma genealogia da trajetória das nossas HQs, com tudo em catálogo e em boa qualidade, como nunca deveria ter deixado de ser.

Roleta russa

CURSO HISTÓRIA DOS QUADRINHOS: TRAJETÓRIA DE UMA ARTE SEQUENCIAL


Ministrado pelos criadores de RAIO LASER

PROGRAMA DO CURSO

EMENTA:

As histórias em quadrinhos têm como marco inaugural uma publicação de 1895, mesmo ano da primeira exibição cinematográfica pública, realizada pelos irmãos Lumière. Elas se inserem na história e na cultura do século XX como um fenômeno de grande influência social e aceitação popular, lentamente requisitando seu lugar no universo das artes. Meio de alta maleabilidade e possibilidades expressivas, os quadrinhos se adaptam a todo gênero de modalidades narrativas: do horror à comédia. Da sátira social ao abstracionismo. Da contracultura à autobiografia. Da fantasia à política. O objetivo deste curso é percorrer um pouco da história desta mídia, em geografias distintas, abarcando também uma introdução à teoria dos quadrinhos.
PROFESSORES:

Ciro I. Marcondes é professor, crítico e pesquisador de Histórias em Quadrinhos e Cinema. Foi professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília, do curso de Cinema do IESB e de Audiovisual no Unicesp. Atualmente cursa doutorado em Comunicação no PPG-FAC da UnB, na linha Imagem e Som. É mestre em Literatura pelo Programa de Pós-Graduação em Literatura do Departamento de Teoria Literária e Literaturas da Universidade de Brasília (UnB). Possui graduação em Letras – Português pela Universidade de Brasília. É o editor do site www.raiolaser.net, especializado em crítica de Histórias em Quadrinhos. Participou da tradução do livro "A Narrativa Cinematográfica", de François Jost e André Gaudreault (Editora da UnB). Produziu verbetes para o "Dicionário de Comunicação" (Ed. Paulus) e produziu o curso "História do Cinema Mundial", em oito módulos, juntamente à UnB e ao GDF. Já ministrou cursos como “História do Cinema”, “Crítica de cinema e análise fílmica”, “Hitchcock e a ilusão do cinema”, “Cinema e filosofia”, para o Espaço Cult, Centro Cultural Banco do Brasil e Espaço Varanda.

Pedro Brandt, jornalista brasiliense formado pela Universidade Católica de Brasília, 31 anos, passou pela editoria de cultura dos jornais Tribuna do Brasil (2005-2007), Jornal de Brasília (2007-2008) e Correio Braziliense (2008-2012), nas quais escreveu sobre diversos assuntos, com destaque para música e histórias em quadrinhos. Produziu e apresentou durante cinco anos (2006-2011), junto com Fernando Rosa, o programa Senhor F, na Rádio Cultura FM de Brasília, com enfoque diferenciado nos clássicos, obscuridades e novidades do rock. Pedro também é produtor eventual de shows e estreia em breve seu selo discográfico, Discos Além. Escreve regularmente para o site especializado em quadrinhos Raio Laser.
CRONOGRAMA:

Aula 01 (07/10) - O surgimento dos quadrinhos + primeiros quadrinhos: ainda no século XIX, os quadrinhos despontaram como mídia influente, industrializada, de conteúdo anárquico e politicamente incorreto. Krazy Kat; Little Nemo; Mutt and Jeff; O menino amarelo. Os funnies e a popularidade das family strips.

Aula 02 (09/10) - Era de ouro americana + o quadrinho de horror (período clássico): a era clássica dos quadrinhos e a ascensão do heroísmo (Flash Gordon, Tarzan, Príncipe Valente, Dick Tracy). A criação do comic book e do super-heróis (Superman; Batman). Will Eisner e Spirit. A popularidade da EC Comics e dos quadrinhos de horror, guerra e ficção científica. O código de censura e o fim da era de ouro.

Aula 03 (14/10) - A cultura da BD e o quadrinho francobelga: os quadrinhos de tradição francófona em duas frentes. A rivalidade entre as revistas Spirou e Tintin e o quadrinho de humor (gros nez e linha clara). Jerry Spring, Lucky Luke, Spirou, Tintim, Asterix, Gaston Lagaffe. O quadrinho adulto francobelga a partir das revistas Pilote e Métal Hurlant. Autores: Dionet, Moebius, Druillet, Lob, Bilal, Jodorowsky, Tardi, etc.

Aula 04 (16/10) – O quadrinho italiano (fumetti) + o quadrinho japonês (mangá): introdução à cultura de HQ pulp das bancas italianas com faroeste (Tex, Ken Parker, Mágico Vento), aventura e horror (Martin Mistere, Dylan Dog, J. Kendall). O quadrinho autoral italiano: Crepax, Manara, Serpieri, Magnus, Liberatori, Tamburini). A cultura de quadrinhos japonesa em seus âmbitos histórico, social, industrial. Mangás e gekigás. Autores: Osamu Tezuka, Hayao Miiazaki, Katsuhiro Otomo, Suehiro Maruo, Yoshihiro Tatsumi.

Aula 05 (21/10) – O super-herói das eras de prata e bronze + O quadrinho nacional: o retorno à cultura de super-heróis a partir da ascensão da Marvel nos anos 1960. Stan Lee, Jack Kirby, Steve Ditko, John Buscema, etc. O dilema do herói na era do Vietnã e no flower power. O amadurecimento dos super-heróis no final dos anos 80 e o surgimento do anti-herói: Frank Miller, Grant Morrison, Neil Gaiman, Brian Bolland, Dave Gibbons. A trajetória do quadrinho brasileiro, desde os primórdios (Angelo Agostini a Tico-tico) até nomes históricos como Maurício, Ziraldo, Henfil, Angeli, Laerte, Glauco, Mozart Couto, Shimamoto, Colin, chegando à contemporaneidade.

Aula 06 (23/10) – Os quadrinhos underground (Comix) e o quadrinho autoral contemporâneo: a cultura de subversão do quadrinho independente americano dos anos 60. De Zap Comix a American Splendor e Raw (Crumb, Shelton, Spain, Pekar, Spiegleman, etc). O amadurecimento dos quadrinhos autorais a partir dos anos 80. Love and rockets e a revolução indie. Autores contemporâneos: Adrian Tomine, Alison Bechdel, Daniel Clowes, Charles Burns, Craig Thompson, etc.

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