A imagem de
Conan na Weird Tales dos anos 1930
O
personagem Conan foi publicado na revista pulp
Weird Tales (Contos Estranhos) nos
anos 1930. A revista normalmente publicava contos de detetives, de fantasia,
terror, ocultismo, ficção científica, western
e/ou suspense, possuindo um padrão de capa bastante característico se
consideramos os tipos de narrativas em seu interior ou mesmo seu publico
leitor, normalmente formado por homens jovens.
Narrativas
com temas de ocultismo temperado com forte conteúdo sexual caracterizavam a
maior parte dos contos da Weird Tales
desde sua origem em março de 1923, possuindo escritores do porte de Robert E.
Howard, famoso pelo subgênero literário conhecido como Sword and Sorcery, além de H.P Lovecraft, Robert Bloch e Clark
Ashton Smith, todos eles com seus contos contra culturais sobre seitas arcanas
secretas, mistérios míticos ou mesmo sobre criaturas demoníacas hibernando em
lugares ermos da Terra, oriundas de mundos interiores ou extraterrestres.

Os
contos pulps, ainda que considerados
sinônimos de literatura de baixa qualidade entre os críticos literários da
época, tiveram relativo sucesso no entre guerras e no pós Segunda Guerra
Mundial, mais especificamente entre os anos de 1920-1950, principalmente diante
de um público leitor masculino sedento por escapismo fantástico em meio à onda
de violência urbana instigada pelo gangsterismo, pelo sentimento de crise da
época da Grande Depressão, bem como pelos ultranacionalismos e totalitarismos
de toda a espécie.
Esses
contos ora concorreram com as primeiras tiras jornalísticas dos super-heróis,
ora influenciaram as narrativas desses personagens fantásticos nas chamadas comic books, em seus momentos iniciais
de veiculação e consolidação. Fora o peso que tiveram na carreira de nomes da
literatura sci-fi do porte de Lester
Dent, Isaac Asimov e Ray Bradbury.

Em
primeiro plano normalmente era representado um herói masculino enfrentando
alguma criatura do mundo sobrenatural para salvar alguma mulher em perigo. Isso
quando a mulher não estava sozinha na capa, amarrada à espera de algum ritual
arcano com traços de sadismo masculino. Se as publicações eram simples e de
baixa qualidade gráfica, os editores esperavam cativar os leitores com capas
impactantes e surreais, munidas de terror e suspense do oculto.
Destaque
para dois fatos interessantes referentes às ilustrações de Brundage na Weird Tales. O primeiro vincula-se às
críticas que seus desenhos sofreram de leitores ou mesmo de integrantes dos
movimentos feministas da época, como se as imagens representassem as mulheres
como meros objetos da degustação voyeur
masculina. O segundo relaciona-se às ações do prefeito de New York da época,
Fiorello La Guardia, na tentativa de impedir novas publicações das imagens da
ilustradora por puro moralismo diletante, condicionando a um desfile de
ilustrações posteriores de cunho ocultista ou mesmo de fantasia regada a
violência extremada.
O
primeiro conto literário do bárbaro cimério foi publicado em dezembro de 1932,
denominando-se “The Phoenix on The Sword”, e foi apenas mais um dos contos
daquela edição, não ganhando sequer uma ilustração de capa, visto que o editor
da revista, Farnsworth Wright, apesar de ter visto “pontos de verdadeira
excelência no conto”, não o considerava suficientemente bom para destacá-lo. A
primeira ilustração de um conto de Conan data somente de junho de 1933, com o
conto intitulado “Black Colossus”, sendo que Conan sequer é mostrado na capa.
Chama
a atenção na imagem acima o tema tradicional das capas da Weird Tales e, especificamente, das ilustrações de Brundage.
Trata-se da imagem de uma jovem nua aos pés da estátua de um homem barbado que
não difere muito de qualquer estátua em estilo clássico de um deus pagão ou
herói grego do Mundo Antigo. O mundo meta-histórico de fantasia criado por
Howard chamava-se Era Hiboriana e
mesclava aspectos culturais, políticos, mitológicos e sociais das civilizações
e sociedades dos períodos históricos que convencionamos denominar de
Antiguidade e Idade Média, ainda que a ilustração de capa em si não tivesse
vinculação direta com o texto publicado no interior da revista.
A
primeira vez que Conan foi retratado preponderantemente na capa da Weird Tales merece destaque,
principalmente porque a ilustração muito difere da imagem que o público em
geral, deveras influenciado pela produção cinematográfica de 1982, estrelada
pelo fisiculturista Schwarzeeneger, possui do personagem. Trata-se do conto “Queen of the Black Coast”, publicado em agosto de 1934, sendo um dos contos
literários howardianos mais cultuados e republicados de todos os tempos devido
ao par romântico entre o bárbaro e a capitã pirata Bêlit, abraçada a Conan na
ilustração de Brundage.
No
supracitado conto, Conan é obrigado a fugir de autoridades argorianas,
aportando em um navio ancorado de um comerciante qualquer, logo tomando parte
entre seus tripulantes. Não muito tempo depois, o navio é atacado pelos piratas
de Bêlit e Conan, após mostrar habilidades em espada e força quase sobrenatural
no enfrentamento dos mesmos, torna-se mesmo um tripulante do navio comandado
pela mulher, tema, aliás, bastante usual em narrativas posteriores do
personagem em diversas mídias.
Apesar
do relacionamento de Conan e Bêlit possuir uma natureza amorosa e afetuosa ao
longo da maior parte do conto, existe certo teor de sadismo da parte dele em
relação a ela, ainda que Bêlit seja tomada por Howard como uma mulher forte,
selvagem, imponente e altiva. Podemos encontrar um exemplo de como Bêlit é
descrita no conto através das palavras do timoneiro do navio mercante que Conan
encontrou ao início da aventura. Vejamos:
"A mulher (Bêlit) é a mais selvagem e demoníaca que já pisou nesse mundo. A menos que eu tenha lido errado os sinais, foram os carniceiros dela que destruíram aquela vila na baía. Espero vê-la um dia enforcada num mastro bem alto! Chamam-na de Rainha da Costa Negra. É uma mulher shemita que lidera bandoleiros negros. Eles atacam e saqueiam os barcos que navegam por aqui, e já mandaram muitos navegantes e comerciantes para o fundo do mar".
"A mulher (Bêlit) é a mais selvagem e demoníaca que já pisou nesse mundo. A menos que eu tenha lido errado os sinais, foram os carniceiros dela que destruíram aquela vila na baía. Espero vê-la um dia enforcada num mastro bem alto! Chamam-na de Rainha da Costa Negra. É uma mulher shemita que lidera bandoleiros negros. Eles atacam e saqueiam os barcos que navegam por aqui, e já mandaram muitos navegantes e comerciantes para o fundo do mar".
A
descrição de Bêlit é, portanto, de uma mulher forte e selvagem, uma saqueadora
que vivia pelas armas, tal como o próprio Conan. Chama nossa atenção, porém, o
fato de a capa da edição da Weird Tales
desvelar a imagem de uma mulher extremamente frágil nos braços do bárbaro,
talvez devido à presença do sobrenatural frente aos dois personagens,
igualmente tratado no conto, ou talvez, tal como mencionado mais acima, como
uma mera ilustração usual e tradicional de Brundage e da Weird Tales.
Mesmo
que as características das capas da revista ajudem a explicar a ilustração da
frágil Bêlit nos braços de Conan, não é descabido pensar aqui nas considerações
de Judith Butler e sua ênfase no discurso de construção de gênero ser concebido
a partir de matizes sociais e culturais definidos por pares binários entre
homem/forte/racional e mulher/frágil/sentimental. Em outras palavras, na
caracterização do ser masculino, pensando-se exclusivamente na imagem, Conan
está em posição de protetor da mulher, conferindo a ideia de que o ser feminino
deve ser protegido, caracterizando aqui não somente um padrão visual de capa,
mas igualmente um discurso cultural sobre gênero.
Uma
imagem que, em nossa opinião, agencia tal discurso de gênero. Conan igualmente
aparece na imagem em uma posição defensiva, com uma espécie de adaga na mão
direita, colocado como protetor de Bêlit, ainda que sua imagem seja muito
distante da imagem selvagem de belicosidade das representações posteriores,
seja nos quadrinhos e no cinema.
No
máximo, o estado de barbárie de Conan, tão exaltado nos contos literários
howardianos, transpareça pelos trajes que ele se utiliza na imagem, um
estereótipo clássico que aproxima o personagem de Tarzan, de Edgar Rice
Borroughs, uma das muitas influências literárias do escritor texano. Na capa da
Weird Tales, Conan parece ser mais a
imagem do “bom selvagem” do iluminista Jean Jacques Rousseau do que do bárbaro
musculoso e violento das ilustrações mais famosas dos quadrinhos ou de outras
mídias visuais mais recentes.
Pela
descrição do próprio criador, Conan muito difere do homem representado nesta
capa da Weird Tales, sendo
normalmente descrito como, “um bárbaro selvagem musculoso, com a pele
bronzeada, os olhos azuis e todo o corpo e rosto marcado por cicatrizes”. Além
disso, Howard fez questão de enfatizar que o estágio de barbárie em seus contos
muito diferia do teor dado por Rousseau em sua concepção filosófica de “bom
selvagem”, como pode ser expresso pela passagem de uma carta do autor texano
logo abaixo:
"Não tenho a visão idílica do bárbaro – até onde pude aprender, trata-se de uma condição sombria, sangrenta, feroz e impiedosa. Não tenho paciência para a representação de um bárbaro de qualquer raça como uma criança cheia de dignidade, feita á imagem de Deus na natureza, dotada de uma estranha sabedoria e falando frases sonoras e bem enunciadas".
Não
é descabido pensar na ideia tradicional de uma humanidade desvelada na imagem
da Weird Tales, visto que em Conan
transparece um ar de impotência e mortalidade ante uma força monstruosa do
mundo sobrenatural. Existe na imagem um padrão de suspense que é típico das
capas pulps, um padrão que coloca
Conan e sua aparentemente frágil companheira como meras caças de alguma
criatura dos reinos inferiores, impactando o leitor pela constante presença do
tema de sobrenatural nestes tipos de contos.
Apesar
da barbárie em Howard muito diferir da visão de Rousseau, Conan é tomado na
imagem da revista como um “bom selvagem” masculino e protetor de uma inocente e
até convencional e frágil mulher, Bêlit (enquanto um arquétipo do gênero
feminino), sem o teor belicista que o caracteriza nas representações
posteriores, evidenciando uma imagem bastante distinta da descrição de sua
figura por Howard, porém não menos interessante dos pontos de vista histórico e
cultural.
O Conan das
capas dos anos 1940-1960, incluindo as ilustrações de Frank Frazetta

Esse fato ocasionou dois
movimentos distintos, porém, interligados: em primeiro lugar, uma primeira
popularização de Conan. Em segundo, uma espécie de movimento “purista” dos fãs
de Howard, que defendiam publicações dos contos tais como foram publicados
originalmente, questionando assim os pastiches literários dos mencionados
escritores.
Antes deles, outro fã de Howard
chamado Glenn Lord havia conhecido os contos literários howardianos originais
na publicação Skull-Face and Others, de
1946, comprando os direitos sobre diversos
contos inacabados e mantendo o legado cultural do escritor texano. De certa
forma, Glenn Lord é visto como um dos grandes expoentes a popularizar Conan
após a morte de seu criador, sendo um dos primeiros a efetuar uma compilação de
relatos e correspondências sobre o escritor.
Trata-se da bio-bibliografia
intitulada The Last Celt: A
Bio-Bibliography of Robert Ervin Howard, considerada uma das mais completas
existentes, de 1976. O livro de Lord, publicado pela D.M. Grant contém diversos
ensaios e entrevistas de pessoas que conheceram pessoalmente Howard, escritores
conhecidos da época cujos trabalhos influenciaram o texano e outros diversos
estudiosos de seu corpus narrativo,
além de excertos do autor. A obra contém também cartas raras, sinopses, fragmentos
de histórias e fotos relacionadas à vida do escritor. A segunda metade do livro
é dedicada a uma bibliografia extremamente bem organizada e completa de grande
parte da ficção pulp de Howard, suas
poesias, ensaios e outros trabalhos catalogados sobre sua vida e obra até
dezembro de 1973.

As capas elencadas chamam a atenção pelos mais variados motivos. Todas
possuem o nome de Howard destacado, não somente em função dos direitos autorais
a seus familiares, mas igualmente em função de seu nome possuir popularidade
como um renomado escritor de fantasia. Podemos notar também que o nome de
Sprague de Camp aparece na publicação intitulada Tales of Conan, de 1955, como se ele fosse uma espécie de segundo
criador do bárbaro.
De
fato a figura de Lyon Sprague de Camp é controversa entre especialistas e fãs
do personagem Conan. Ele escreveu diversas narrativas e pastiches sobre Conan,
criando novos personagens e até outras cidades, reinos, sociedades e
civilizações da Era Hiboriana,
utilizando-se das viagens que fazia ao Oriente Médio ou outros tantos lugares
antigos e distantes para uma descrição mais pormenorizada de reinos e
civilizações do mundo fictício howardiano.
Sprague
de Camp é também o responsável pela biografia mais famosa e popular sobre o
escritor texano, sendo, no entanto. a mais criticada pelos especialistas e fãs.
Trata-se da obra Dark Valley Destiny: The
Life of Robert E. Howard, escrita por ele e sua esposa, Catherine, e
publicada em 1983. O autor deteve por muitos anos os direitos autorais sobre os
contos literários originais de Conan, sendo um daqueles escritores que se tornaram
uma das maiores referências sobre o personagem ou mesmo sobre o escritor, ao
mesmo tempo em que passou a ser criticado e até odiado pelos chamados fãs
puristas de Howard.
A
biografia em questão possui sérios problemas de qualidade e de seriedade em razão
dos diversos juízos de valor carregados sobre o caráter, a psiquê, a
personalidade e a conduta do escritor texano, com muitas inferências
completamente destituídas de quaisquer evidências ou qualquer apresentação de
documentação histórica mais criteriosa. Além disso, deve-se destacar o teor
acusativo das críticas de Sprague de Camp em torno dos diversos contos
literários escritos por Howard, em uma espécie de autopromoção às custas da
obra do escritor texano, como se Conan devesse mais a ele por ser um ícone da
cultura popular do que a seu próprio criador.

Esse
tema, aliás, não aparece nas capas elencadas logo acima, significando a saída
de cena do gênero terror e ocultismo, típicos dos contos pulps. Com tais capas, temos a vinculação do bárbaro a temas
vinculados ao cinema épico hollywoodiano da época, com filmes do porte de Ben-Hur, de 1959 ou Spartacus, de 1960. Conan é assim transfigurado de um quarentão
rústico semelhante ao personagem Tarzan em um jovem imponente vergando
armaduras tradicionais em estilo clássico e cinematográfico.
![]() |
Spartacus com Kirk "100 anos" Douglas |
Agora,
sem sombra de dúvida foi a arte do ilustrador e quadrinista Frank Frazetta que
primeiramente impulsionou a imagem que temos hoje em dia sobre Conan. Frazetta
se tornou conhecido a partir dos anos 1960 como ilustrador de capas de livros,
principalmente de reedições de contos ou novelas de Tarzan e mesmo de Conan.
Antes disso, ele havia sido ilustrador anônimo de histórias em quadrinhos de
renome, tais como Flash Gordon ou Ferdinando (Li'lAbner), famoso título
criado nos anos 1930 pelo brilhante roteirista e argumentista estadunidense Al
Capp, trabalhando nos desenhos da família de Brejo Seco por nove anos, entre
1953 e 1962.
![]() |
O quadrinho Li'l Abner (Ferdinando) desenhado por Frank Frazetta |
As
ilustrações de Frazetta para as capas de livros de contos de Conan são as mais
cultuadas entre os fãs do bárbaro, algumas delas sendo comumente vendidas por
somas vultosas para colecionadores. Seu estilo possui uma tonalidade quase
barroca, situando Conan como um bárbaro celta bretão, tal como descrito por
Howard nos contos literários originais.
Não
se pode esquecer que Howard descrevia os povos de sua Era Hiboriana a partir de
modelos de povos, comunidades e civilizações existentes de nossa história,
sendo os chamados cimérios, povo fictício do qual Conan fazia parte no corpus literário howardiano, equivalentes
aos celtas bretões de uma Inglaterra pré-romana.
As
capas de Frazetta foram a principal marca dos vários livros de contos
publicados a partir do ano de 1966 pela editora Lancer Press, fossem tais
contos republicações dos vinte e um contos originais finalizados por Howard,
fossem os escritos por Sprague de Camp e Carter. Os livros normalmente
continham introduções desses escritores sobre a Era Hiboriana, cartas de Howard
dos anos 1930, novos mapas e cidades do mundo fictício do bárbaro, pastiches
inacabados de Howard sobre Conan ou mesmo sobre algum outro personagem do
texano, todos finalizados ou adaptados para que se tornassem novos contos de
Conan.
O
desenho de Frazetta coloca Conan como um bárbaro mais belicoso, altivo e
ameaçador se comparado à figura das capas dos anos 1930 e mesmo a dos anos
1940/1950. Conan também deixa de ser o bárbaro com ar civilizado das capas
anteriores da editora Gnome Press, para se tornar eminentemente fora dos
padrões dos homens civilizados, normalmente vergando armas brancas respingando
sangue e com o torço desnudo na maior parte do tempo.
Sua
postura é comumente de ataque, mesmo cercado por inimigos em número maior ou
mesmo por monstros saídos do mundo sobrenatural, o que difere das capas dos
contos dos anos 1930, que o colocavam em uma posição defensiva. Também aqui se
encontra o tema da guerra épica e brutal, de uma incansável vida de conflitos,
como se a guerra fizesse parte de seu ser não-civilizado. A ideia de barbárie
aqui é menos óbvia e menos idealizada, afastando Conan de qualquer imagem de “bom
selvagem” de Rousseau.
Frazetta
capturou muito do texto howardiano em suas pinturas e ilustrações de capa,
utilizando-se de elementos fantásticos mesclados à aventura, ao realismo, à
guerra épica e ao apelo sobrenatural. Este elemento sobrenatural não era
somente algo a ser temido, mas combatido a ferro e fogo pelas mãos de um
bárbaro quase bestial, ainda que nada sugira tratar-se de alguém destituído de
inteligência ou de comedimento fora da ação e do combate.

O
enunciado é esclarecedor sobre o personagem Conan na visão de Howard,
demonstrando, em nossa opinião, o teor da leitura de Frazetta para esboçar suas
ilustrações do bárbaro cimério, ainda que a belicosidade das imagens tenha
condicionado a outras tantas interpretações posteriores. Conan vivia
intensamente, matava intensamente, mas não deixava de se perguntar sobre as
coisas do mundo, da realidade e do pós-morte. Conan aceitava viver plenamente
no campo de batalha, em meio a perigos constantes, sendo feliz desta forma e
aceitando tal plenitude intensamente, sem se culpar ou recuar diante das
ameaças do mundo sobrenatural.
O
clamor da batalha era algo esperado e até aclamado em seu ser e as capas de
Frazetta captaram essa personalidade forte e selvagem, ainda que de uma
sabedoria de vida peculiar. As imagens de capa de Frazetta beberam dessa rica
fonte literária do gênero da fantasia, mas traduziram de forma suis generis essa fonte de modo a tornar
tal imagem um padrão, tanto nos quadrinhos como em outras mídias visuais. As
imagens agenciaram toda uma gama de outras ilustrações que mais tarde seriam a
tônica do personagem nas mídias como um todo.
Aliás,
em um texto introdutório de uma narrativa de quadrinhos dos anos 1980, Glenn
Lord reiterou que Frazetta teve um papel ainda mais ativo na construção da
imagem de Conan perante a cultura midiática como um todo do que todos os
escritores de contos dos anos posteriores à década de 1930.

Muito
mais do que expressar visões gerais da sociedade sobre a barbárie, as capas de
Frazetta ajudaram a estabelecer e/ou mesmo a consolidar essa imagem específica,
vinculando Conan ao bárbaro por excelência e a condutas tomadas como típicas de
um bárbaro. Selvageria e sanguinolência se tornaram cada vez mais sinônimo de
barbárie e nos parece que essas imagens contribuíram para isso, ainda que com
certas doses de idealizações do ser bárbaro.
Se,
nos anos 1930, a imagem de Conan o aproximava do “bom selvagem” protetor da
pureza humana e de mulheres em perigo, pelo menos como imagem de capa da Weird Tales, nos anos 1960 essa imagem
se transformou. O Conan de Frazetta se tornaria a base visual do Conan e da
própria barbárie que seriam difundidas nas histórias em quadrinhos das décadas
seguintes, responsáveis por iniciar a consolidar o personagem como um ícone da
cultura popular do século XX.
O Conan da Marvel Comics dos anos 1970-1980: entre
Windsor-Smith e John Buscema
Em
1970, a empresa Marvel Comics pagou uma licença de dois mil dólares por edição
para publicar narrativas de Conan, dividindo suas tramas em dois tipos de
formatos voltados para públicos diferentes. A publicação em estilo magazine
intitulada, The savage sword of Conan,
de 1974, era voltada para um público um pouco mais adulto, enquanto que o
público infanto-juvenil tinha outra revista, anterior àquela e em estilo comics, publicada a partir de outubro de
1970, denominada simplesmente de Conan,
the barbarian, com tramas mais simples e com menos teor de violência ou apelo
sexual.
O
responsável por trazer o bárbaro para a empresa do ramo de quadrinhos que mais
crescia nos EUA foi o escritor/editor Roy Thomas, que se manteve à frente do
personagem nas duas publicações por longos anos. As palavras de Thomas sobre o
assunto demonstram que as capas de Frazetta dos contos republicados de Howard
ou mesmo aqueles criados por Sprague de Camp e Lin Carter eram mais famosas do
que os próprios contos literários originais howardianos, pelo menos entre
aqueles do ramo de quadrinhos da época. Vejamos o excerto que se segue:
"Eu era editor associado na época, e as pessoas me enviavam todas essas cartas de leitores que diziam que nós deveríamos trazer personagens dos livros para os quadrinhos. Havia quatro coisas que continuavam chegando: uma era o Conan, de Robert Howard, ou algo do gênero – Howard era o autor mais mencionado. As outras três eram Tolkien (autor de o Senhor dos Anéis), Doc Savage (personagem da literatura pulp dos anos 1930) e Edgar Rice Burroughs, com coisas como Tarzan e John Carter of Mars. Nós tentamos todos eles e acabamos conseguindo todos, menos Tolkien. Eu preparei um memorando para o editor Martin Goodman dizendo por que deveríamos licenciar um personagem – não me lembro porque simplesmente não criamos um novo. Acho que Lee (Stan Lee, o criador da maior parte dos super heróis da empresa, tais como Homem-Aranha, Hulk e Quarteto Fantástico) não sabia ao certo o que era Espada e Feitiçaria e eu mesmo não havia lido o suficiente na época. Eu não tinha lido muito de Howard, havia apenas comprado alguns de seus livros por causa das capas de Frazetta, mas nunca os havia lido de fato."
Ao
ser quadrinizado pela Marvel, Conan se popularizou, iniciando sua consolidação
como um personagem icônico do século XX, ao mesmo tempo em que se tornou o
modelo de todo um gênero de fantasia, influenciando outras tantas mídias,
suportes e narrativas fantásticas semelhantes. Não devemos esquecer, aliás, que
os estudos sobre cultura visual partem da premissa da necessidade de
compreensão da produção, circulação e consumo de imagens, tal como estabelecido
por Nicolas Mirzoeff com seu conceito de “mundo como imagem”. A esse propósito,
o pesquisador Ulpiano Bezerra de Meneses reitera a necessidade em se “retraçar
a biografia, a carreira e a trajetória das imagens”.
Saído
da literatura pulp e difundido nos
anos 1960 nas capas dos livros de contos com ilustrações de Frank Frazetta,
Conan chegou pela primeira vez aos quadrinhos pelas mãos de um jovem
desenhista, desconhecido na época, chamado Barry Windsor-Smith, que concebeu um
Conan “muito ágil, esguio e com cabelos compridos à moda glam rock”. Vejamos a
primeira capa de Conan, Tne Barbarian, com
o traço do referido desenhista:
É
difícil não perceber na capa o padrão tradicional das pulps, com um Conan em primeiro plano rodeado de inimigos, portando
uma espada e tendo uma mulher em apuros a seus pés, uma marca presente nas
capas do bárbaro desde os anos 1930. Aliás, os estudos em cultura visual
igualmente reiteram a importância de captarmos reminiscências de média e longa
duração histórica em imagens específicas, tal como elucidado por Ulpiano Meneses.
Além
disso, é preciso não esquecer o importante conceito de “iconosfera”, tratado
pelo mesmo estudioso, que pode ser traduzido como o conjunto de imagens
socialmente veiculadas e disponíveis em dado contexto histórico. Observando a
primeira capa de Conan sob o traço de Windsor-Smith, é possível observar o
estilo dinâmico característico dos quadrinhos de super-heróis Marvel da época.
No caso da capa acima, não muito diferente do estilo estético do inigualável
Jack Kirby, considerado o maior ilustrador da Marvel de todos os tempos e que
fez escola no mundo das comics.
A
capa de Conan, The Barbarian nº 1 em
muito se assemelha a outras capas de super-heróis Marvel dos anos 1970, especificamente
aquelas que traziam personagens mitológicos e/ou de fantasia, reforçando a
ideia de iconosfera, mencionada acima. Segue abaixo um exemplo do personagem
mitológico, Thor, pelo estonteante “pincel” de Kirby:
O
personagem aqui, tal como o Conan da capa anterior, evoca desespero e fúria
ante uma horda que o cerca, com balões de chamada para os leitores não muito
diferentes das chamadas em recordatórias da capa do bárbaro cimério. O estilo
ação-para-ação, muito comum no traço de Kirby e outros artistas da Marvel, da
maneira como é apontado por Scott McCloud, está presente na capa e na
narrativa em arte sequencial do interior de ambas as revistas.
Estamos
sugerindo com isso que da mesma forma que as capas pulps dos anos 1930 seguiam seu próprio modelo, ou seja, seus
padrões estéticos e artísticos de acordo com imagens disponíveis de seu
contexto ou mesmo de seu suporte midiático específico, as capas do cimério nos
quadrinhos dos anos 1970 igualmente seguiram seus respectivos padrões
estéticos, históricos e midiáticos.
O
ar belicoso de Frazetta está igualmente acentuado na imagem de capa de Conan,
com um bárbaro igualmente cercado por hordas inimigas, incluindo seres bestiais
do mundo sobrenatural. O rosto estampado de fúria e terror também mimetiza em
parte a arte de Kirby e mesmo de Frazetta, no último caso, adaptada para as
narrativas dos quadrinhos. O tom épico belicista na capa de Conan é um tanto
distinto das capas dos anos 1940/1950 e bastante aproximado ao das capas da
Lancer Press dos anos 1960, só que agora com tons mais vivos, típicos das
publicações de quadrinhos Marvel.
A
quadrinização de Conan na editora estadunidense deve-se a diversos fatores,
sendo alguns deles bastante pontuais. Um deles relaciona-se ao direcionamento
corporativo da Marvel, que, no final da década de 1960 e início da década
seguinte, estava ampliando seu público leitor e seus preços de capa, envolvendo
leitores universitários que cresceram lendo quadrinhos de super-heróis e que
agora possuíam condições financeiras de bancar coleções mensais mais
sofisticadas.
Além
disso, havia uma nova geração de profissionais tomando conta do mercado de
quadrinhos da indústria cultural nos EUA, jovens talentosos intelectualizados
que igualmente cresceram lendo quadrinhos e que agora queriam explorar o
universo do realismo emocional através de dilemas sociais ou mesmo mediante o
cotidiano das lutas das minorias pelos direitos civis, tudo isso mesclado ao
escapismo lúdico idealizado dos quadrinhos Marvel.
Muitos
desses jovens quadrinistas eram verdadeiros apologistas das grandes editoras e
de seus icônicos personagens, levando a profissão quase que como um credo de
fãs desses respectivos personagens. Talentosos artistas do porte do já
mencionado Thomas, além de Dennis O’Neil, Chris Claremont, John Byrne, Frank
Miller, Jim Starlin, dentre outros, ampliaram os limites dos quadrinhos da
indústria cultural, em comunhão com a energia cultural dos anos 1970, embebida
de autocrítica, eminentemente antiautoritária e que degustava filmes
hollywoodianos anti-establishment do
porte de O Poderoso Chefão, Perseguidor
Implacável, Desejo de Matar, Taxi Driver e Perdidos na Noite.
![]() |
Taxi Driver: Nova Hollywood |
Tais
autores e quadrinistas, além de elevar os questionamentos sociais dos
quadrinhos da indústria cultural, buscando temas polêmicos como o uso e o
tráfico de drogas, a violência urbana e doméstica, o racismo, a guerra do
Vietnã, o alcoolismo, a metalinguagem e o sexismo, igualmente trouxeram
aspectos e temas dos quadrinhos de terror, fantasia, ficção e de detetives dos
anos 1930, muitos dos quais influenciados pela própria literatura pulp.
Conan
foi quadrinizado ao lado de outros personagens pulps do porte de The Shadow, de Edgar Rice Borroughs, adaptado por
Len Wein e Michael Kaluta; Doc Savage, de Lester Dent; e o próprio Tarzan, que
na Marvel foi adaptado pelo mesmo Roy Thomas, ao mesmo tempo em que era criado
um herói inspirado nele chamado Ka-Zar.
Os
quadrinhos da indústria cultural viviam um momento de complexificação de seus
temas e estilos diante das exigências de um público leitor mais sofisticado e
com maior poder aquisitivo e as primeiras adaptações de Conan não podem ser
desvinculadas de todos esses fatores. Ainda sim, a revista Conan, the barbarian era bastante leve e
lúdica diante desse movimento com toques realistas regados a violência,
suspense e terror, não dando conta das novas demandas dos leitores um pouco
mais velhos.
As
exigências desse público, os interesses corporativos da Marvel em ampliar as
vendas e o próprio culto de Roy Thomas ao traço de Frazetta em Conan levaram-no
a se unir ao talentoso ilustrador John Buscema em outra publicação sobre o
bárbaro, dessa vez em preto e branco e com um tom mais pesado, muito próximo ao
da literatura pulp howardiana.
![]() |
Buscema |
Tratava-se
do já mencionado título Savage sword of
Conan, publicado a partir de 1974, possuindo o traço mais marcante do
bárbaro nas histórias em quadrinhos, aquele do inigualável ilustrador John
Buscema, famoso quadrinista que até então era responsável pela arte de
personagens icônicos da Marvel do porte de Thor, Vingadores e Surfista Prateado.
Buscema tornou-se o ilustrador de Conan nos dois títulos mensais da editora,
porém, na revista em preto e branco chegou ao auge criativo, aproveitando-se do
jogo de luz e sombras para consolidar um Conan mais robusto e viril, quase que
uma representação de um verdadeiro “titã de bronze”, como constantemente era
descrito por Howard nos contos literários originais.
A
Marvel já tentara adaptar o personagem em narrativas mais adultas e em formato
magazine preto e branco, como o exemplo da publicação intitulada Savage tales, de 1971, mas foi na
publicação de 1974 que Thomas e Buscema encontraram o tom ideal do personagem
nos quadrinhos, começando por adaptar os contos originais de Howard, usando,
inclusive enunciados inteiros extraídos desses respectivos contos. Mesmo quando
as narrativas eram inovadoras, elas continham o tom howardiano, seja em razão
da ausência de uma cronologia para as aventuras do cimério, seja pela presença
do tema da oposição entre civilização e barbárie que caracterizavam as
primeiras narrativas.
O
diferencial das narrativas em quadrinhos de Thomas e Buscema vincula-se ao tom
mais desafiador das tramas em termos de ação e emoção, narrativas mais
aventureiras a explorar os limites físicos do personagem, muitas delas munidas
de valores importantes para os jovens rebeldes da geração 1970. Podemos
destacar aqui a defesa do indivíduo e das liberdades individuais contra
autoridades instituídas por coletivos específicos (Exército, Igreja e Estado,
por exemplo), quase que a epopeia de um espírito juvenil livre e eminentemente
belicoso a se desvincular das amarras sociais existentes, o que, em nossa
sociedade, seriam vistas como criações dos adultos e progenitores dos jovens
leitores.
As
imagens de Conan ilustradas por Buscema expressam o apelo da liberdade
individual de um bárbaro em relação às normas sociais das civilizações de seu
mundo ficcional. O personagem aparenta ser um bloco sólido de pura selvageria,
liberdade, ar sisudo, força física e mental, uma resistência sem igual diante
das agruras da vida e da luta pela sobrevivência nas fronteiras mais distantes
da civilização, normalmente rodeado pelas mesmas mulheres que constantemente
necessitavam de sua proteção nas capas pulps
dos anos 1930.
Novamente
a questão de gênero está presente, definindo-se as imagens por pares binários:
o ser masculino protetor como a antítese do ser feminino a ser protegido, o ser
bárbaro selvagem e instintivo como a antítese do ser civilizado, normalmente
tomado nos contos e nas HQs como eminentemente ganancioso e decadente, tema
usual nos contos literários, mas que nas imagens de Buscema ganham contornos
extremos. O traço em preto e branco produz uma silhueta sombria que confere a
Conan a melancolia e a selvageria dos contos literários originais howardianos
sem, no entanto, transparecer que sua figura pereceria perante quaisquer
obstáculos, incluindo aqueles advindos do mundo sobrenatural.
O
traço de Buscema eleva Conan a um homem situado para além da fronteira das
normas existentes, estando às margens da civilização. Trata-se da representação
visual de um espírito livre que não se desdobra frente a quaisquer problemas a
serem enfrentados. Além disso, seu porte físico se torna ainda mais avantajado
do que o ágil e esguio Conan do traço de Barry Windsor-Smith, mais próximo aqui
ao traço de Frank Frazetta.
A
título de informação, podemos retraçar as características físicas dos
super-heróis e as influências existentes no esboço dessas respectivas
características. Entre os anos 1930-1950, os super-heróis tiveram suas imagensassociadas aos homens fortes dos circos, com seus portes físicos em blocosólido e seus colants multicoloridos,o que influenciou a anatomia física e os uniformes dos personagens da chamada “Erade Ouro” dos quadrinhos.
Em
meados da década de 1950 e, depois, ao longo da década de 1960, que compreende
o início da chamada “Era de Prata” das comics,
os super-heróis se tornaram fisicamente menos robustos, mais ágeis, esguios,
com portes físicos mais definidos, muitas vezes mimetizando os atletas
olímpicos de corrida de curta distância ou os astronautas da corrida espacial,
quando não o homem comum, visto que aspectos de realismo começaram a fazer
parte das narrativas em quadrinhos do gênero.
Os
anos 1970-1980 trouxeram de volta as idealizações físicas dos personagens de
quadrinhos de super-heróis, agora com a influência marcante dos fisiculturistas
(pelos menos em relação aos homens, visto que as mulheres normalmente eram
retratadas com portes físicos de modelos famosas ou mesmo de atrizes de
Hollywood). Não se pode, portanto, deixar de associar a imagem de Conan de narrativas
de quadrinhos pós anos 1970 dessa estética específica, visto que sua
quadrinização ocorreu em uma empresa especializada em super-heróis, sendo
efetuada por artistas que faziam parte desse gênero específico de quadrinhos e
que eram influenciados pelas características artísticas, estéticas e históricas
do referido gênero e do suporte midiático em questão.
Lou Ferrigno (dir.): nos 1970's |
O
fisiculturismo começou a ser visto na televisão, em eventos beneficentes para
estimular as atividades físicas ou até como recuperação de presidiários,
aparecendo igualmente em filmes-documentários sobre o esporte, como é o caso do
reconhecido filme-documentário Pumping iron,
veiculado em 1975.
Para
muitos estudiosos do assunto, esta foi a chamada “Época de Ouro” dos torneios
de fisiculturismo, dentre os quais, o Mister
Universo, torneio com atletas amadores e o Mister Olympia, eminentemente profissional e deveras conceituado
entre os atletas mais renomados do esporte até os dias de hoje. Esses torneios
tornaram o fisiculturismo quase que um padrão cultural corporal mercadológico
ansiado por muitos jovens, principalmente no final dos anos 1970 e a partir da
década de 1980 em diante.

Não
podemos deixar de comentar também que a magazine em preto e branco lançada em
1974 não precisou se adequar à autocensura do famigerado Código de Ética dos
Quadrinhos (Comics Code Authority),
criado pelas próprias editoras em 1954. A criação desse mecanismo de
autocensura ocorreu devido a perseguições que as comic books sofreram nos EUA na década de 1950, seja em razão da
paranoia anticomunista insuflada pelo macarthismo, seja em função da influência
nefasta da obra The seduction of the innocent,
do psiquiatra alemão Fredric Wertham, que relacionou de forma imprudente e
carente de qualquer validação o problema da delinquência juvenil com a leitura
de quadrinhos, principalmente aquelas narrativas de terror, super-heróis e
fantasia.
As
grandes editoras estadunidenses procuraram se colocar de fora dos “holofotes”
do Estado e de sansões regulatórias que pudessem impedir ou limitar a
distribuição e, consequentemente, as vendas de seus quadrinhos. Para tais
motivos, as grandes editoras criaram um código de ética próprio que literalmente
autocensurava diversos aspectos das publicações em estilo comics, proibindo temas diversos e coibindo a liberdade criativa
dos argumentistas e ilustradores do respectivo suporte midiático.
Não
fazendo parte desse esquema de autocensura, muito em função do tipo de
publicação em estilo magazine em preto e branco, do direcionamento ao público
leitor e também devido ao contexto dos anos 1970, no qual artistas e editores
cada vez mais não aceitavam o enquadramento das normas limitantes do código, as
narrativas de Conan em Savage sword of
Conan veicularam diversas liberdades criativas e imagéticas, sem quaisquer
“freios”. Com isso, a revista apresentou cenas de violência explícita e certo
teor sexual, concedendo liberdade criativa que a publicação em estilo comics de Conan não possuía por estar
subordinada ao supracitado código.

O
musculoso Conan era cada vez mais o típico fisiculturista temerário com alguma
arma branca em mãos vertendo sangue, sempre pronto para enfrentar algum monstro
genérico saído do mundo sobrenatural. Normalmente ao seu lado há uma linda
mulher em perigo, remetendo diretamente às capas pulps, mas com a arte adaptada ao estilo Marvel de uma publicação
magazine sem as censuras.
Na
maioria das vezes, as capas não tinham qualquer relação com a narrativa em arte
sequencial do interior da revista, demonstrando o apelo da imagem para além da
própria narrativa em termos de veiculação e vendagem. Além disso, cada um dos
artistas convidados emprestava seu estilo a um padrão pré-estabelecido e
deveras apelativo para o público jovem masculino, sedento por tramas com poucos
freios em termos de violência, liberdade e sexualidade, o que propiciou sucesso
imediato de vendas da referida publicação.
Nos
quadrinhos não existia mais a imagem daquele Conan quarentão da Weird Tales dos anos 1930, o bárbaro
mimetizado na figura de Tarzan com doses de “filosofia rousseauniana”, colocado
usualmente em uma posição defensiva e até existencial diante de alguma criatura
bestial ou mitológica.
Nos
quadrinhos Marvel da revista Savage sword
of Conan observa-se a imagem que se consolidou na cultura midiática
industrial como um todo: a imagem de um homem violento, sanguinolento e
temerário, munido de armas brancas vertendo sangue e que se colocava em posição
de ataque frente a qualquer desafio, fosse um desafio humano ou sobre-humano.
Faltava apenas o cinema para consolidar essa imagem do bárbaro cimério e da
barbárie como um todo, o que ocorreu em 1982 com o primeiro filme de Conan.
5 comentários
Frazetta também trabalhou em comic books, criou as séries Thun'da e White Indian para a Magazine Enterprises nos anos 50, também nessa década, a editora Avon publicou Crom the Barbarian do Gardner Fox (que também escrevia pulps e fez o roteiro da primeira história do Thun'da) e no México publicaram uma versão pirata de A Rainha da Costa Negra.
http://www.anageundreamedof.com/2013/05/la-reina-de-la-costa-negra-mystery-of.html
http://amazingstoriesmag.com/2013/06/crom-the-barbarian-the-first-true-ss-comic/
Um outro texto que gostei que fala do Conan foi esse
http://www.iniciativanerd.com.br/conheca-verdadeiro-conan-cimeria/
Boa lembrança, amigo Quiof.
Essa versão mexicana da Rainha da Costa Negra, eu encontrei um scan, e fiz a tradução ao português, e pode ser visto nesse link...
http://cavernadacaveira.blogspot.com.br/2015/09/a-rainha-da-costa-negra.html?m=1
Bom, agradeço aos comentários acima, pois complementam informações sobre esse gênio dos quadrinhos e ilustrações. Vou pesquisar mais a partir dos links postados. abs.
Achei há pouco uma capa do Wally Wood que é anterior as do Frazetta, é de 1957
https://comics.ha.com/itm/original-comic-art/covers/wally-wood-the-return-of-conan-hardback-book-cover-original-art-gnome-press-1957-the-barbarian-king-has-pretty-much/a/816-2581.s
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